Redação Publicado em 11/07/2025, às 10h00
Comer queijo pode revirar seu intestino se você tem intolerância à lactose. E uma pesquisa sugere que isso pode causar outra reação desagradável: pesadelos.
Um estudo publicado no periódico Frontiers in Psychology encontrou ligações entre a alimentação de uma pessoa, a qualidade do sono e seus sonhos.
“A gravidade das sensibilidades alimentares – especialmente a intolerância à lactose e uma medida combinada de alergias alimentares – está associada à intensidade dos pesadelos”, disse o autor do estudo, Tore Nielsen, professor de psiquiatria e diretor do laboratório de sonhos e pesadelos da Universidade de Montreal, no Canadá.
Segundo Nielsen, pesadelos e emoções negativas durante os sonhos também foram mais comuns entre os participantes do estudo que relataram padrões alimentares menos saudáveis.
Muita gente acredita, pelas próprias experiências, que o consumo de certos alimentos à noite pode afetar seu sono, mas os pesquisadores quiseram investigar se os dados sustentariam essa conexão.
Eles entrevistaram 1.082 estudantes universitários no Canadá sobre seus hábitos alimentares, qualidade do sono, saúde física e mental, frequência de sonhos, sonhos lúcidos, ocorrência de pesadelos e se acreditavam que a alimentação poderia afetar seu sono ou sonhos.
Os resultados mostraram que mais de 40% dos participantes disseram que a qualidade do seu sono era afetada pelo que comiam. Alimentos como laticínios e doces foram os mais associados a um sono ruim, enquanto chás de ervas, frutas e vegetais foram relacionados a um sono melhor, segundo os relatos.
No entanto, apenas uma pequena porcentagem (5,5%) acreditava que sua dieta influenciava seus sonhos. Esse grupo era mais propenso a ter alergias alimentares e intolerância ao glúten, mas não mais propenso a ter intolerância à lactose.
Curiosamente, ao analisarem os dados, os pesquisadores encontraram uma forte ligação entre a gravidade dos pesadelos, alergias alimentares e intolerância à lactose. E os participantes que acreditavam que a alimentação poderia piorar a qualidade do sono também tinham mais probabilidade de apresentar intolerância à lactose.
“Parece que, segundo os dados, a intolerância à lactose causa sintomas gastrointestinais relacionados aos pesadelos”, afirmou Marie-Pierre St-Onge, professora de medicina nutricional na Universidade de Columbia, nos EUA, em entrevista ao site Health.
“Se você tem sintomas gastrointestinais durante o sono, é mais provável que tenha distúrbios que afetam os estágios do sono relacionados aos sonhos.”
Isso também pode explicar por que participantes que comiam tarde da noite ou que não comiam com base na fome, mas por hábito ou outros motivos, relataram mais sonhos negativos ou pesadelos.
Apesar de os resultados do estudo serem interessantes, são necessárias mais evidências.
Por exemplo, St-Onge apontou que os participantes universitários receberam nota extra por participar da pesquisa, o que representa uma amostra enviesada. Além disso, como os dados foram obtidos por meio de questionários, as opiniões ou preconceitos dos participantes sobre alimentação e sono podem ter distorcido os resultados.
Embora este estudo tenha relacionado o sono ruim à intolerância à lactose, outras pesquisas mostraram que os laticínios podem até ajudar a melhorar o sono para a maioria das pessoas.
St-Onge publicou dois artigos — um em 2016 e outro em 2023 — que apontaram que o leite pode ajudar as pessoas a dormir melhor.
Segundo seu estudo, os laticínios são ricos em triptofano, um aminoácido envolvido na produção de serotonina e melatonina, que são essenciais para pegar no sono e permanecer dormindo. Os laticínios também podem ser benéficos para o microbioma intestinal, o que ajuda na qualidade do sono, acrescentou.
Estudos focados em pessoas com intolerância à lactose são escassos. Um estudo de 1988 com bebês com intolerância ao leite mostrou que eles dormiam melhor quando evitavam o leite. Já um relatório de 2020 observou que a literatura médica não apresenta dados sobre os efeitos dos laticínios no sono de adultos com intolerância à lactose.
Embora o efeito específico dos laticínios no sono ainda seja incerto, há muitas evidências de que a alimentação influencia a qualidade do sono, afirmou St-Onge.
É bem conhecido que altos níveis de açúcar, cafeína e álcool têm efeitos adversos no sono. Mas não para por aí:
“Sabemos que seguir uma dieta saudável está associado à redução do risco de distúrbios do sono, enquanto seguir uma dieta menos saudável aumenta esse risco”, explicou St-Onge.
Mais pesquisas são necessárias para entender se as pessoas dormem mal porque se alimentam mal ou se comem mal porque dormem mal – ambas situações já foram observadas em estudos anteriores.
No dia a dia, o novo estudo de Nielsen indica que sintomas gastrointestinais causados pela alimentação podem ser mais uma forma de a dieta afetar o sono.
Em estudos anteriores, Nielsen e sua equipe estimularam o corpo durante o sono REM (fase em que os sonhos são mais vívidos) e descobriram que isso alterava o conteúdo dos sonhos.
Há indícios de que distúrbios físicos podem se manifestar em sonhos negativos, como sonhar com incêndios ou desenvolver febre, segundo Nielsen.
“Um foco maior na conexão entre problemas gastrointestinais e sonhos pode ajudar a encontrar formas de lidar com pesadelos”, acrescentou.
Ainda não há consenso sobre o que comer ou evitar para prevenir pesadelos.
Se você costuma ter sonhos estressantes, pode valer a pena investigar se tem intolerância à lactose ou outra alergia alimentar, sugeriu Nielsen.
Contudo, ele alerta que não é tão simples quanto dizer para as pessoas cortarem todos os laticínios caso tenham intolerância, pois muitos os consomem por diversos motivos.
Mas, no mínimo, se você sabe que queijo, leite ou qualquer outro alimento causa desconforto digestivo, o melhor é evitar comê-lo antes de dormir, aconselha o pesquisador.
Também há alimentos que você pode incluir na dieta para melhorar o sono em geral. Pesquisas apontam que:
- Ovos, peixes, nozes, cogumelos e suco de cereja contêm melatonina, que pode ajudar a adormecer.
- Peru, frango, clara de ovo e sementes (além de laticínios) contêm triptofano.
- Bananas, folhas verdes, abacate, leguminosas e outros alimentos ricos em magnésio podem promover o sono.
Em resumo, segundo uma nova pesquisa publicada no mês passado por St-Onge, uma boa dieta para o sono é rica em frutas, vegetais e fibras, e pobre em carnes vermelhas e processadas.
Fonte: Health