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Comer próximo à hora de dormir aumenta risco de diabetes, aponta estudo

Outra questão a ser levada em conta além do horário é o que se está comendo tarde da noite - iStock
Outra questão a ser levada em conta além do horário é o que se está comendo tarde da noite - iStock

Cármen Guaresemin Publicado em 24/02/2022, às 10h00

Você costuma jantar quanto tempo antes de ir para a cama?

  • De 1/2 hora a 1 hora antes de me deitar
  • Cerca de 2 horas antes de ir para a cama
  • Mais de 2 horas antes de ir para a cama

Jantar perto da hora de dormir, quando os níveis de melatonina estão altos, está associado à diminuição da secreção de insulina e diminuição da tolerância à glicose, o que aumenta o risco de diabetes tipo 2. É o que mostra um estudo do Centro de Genômica Medicina do Hospital Geral de Massachusetts, Boston, em colaboração com a Universidade Harvard, ambos nos Estados Unidos, em parceria com a Universidade de Múrcia, na Espanha, e publicado recentemente no periódico Diabetes Care.

Segundo Richa Saxena, autora sênior da pesquisa, realizada na Espanha, onde, culturalmente, se janta mais tarde, foram simulados jantares cedo e tarde, acrescidos de uma bebida com glicose. Em seguida, os efeitos no controle do açúcar no sangue dos participantes foram comparados por duas horas. Também foram checados os resultados em pessoas com e sem a variante do alelo G do gene do receptor de melatonina, pois as que o possuem têm maior comprometimento na tolerância à glicose depois de jantar mais tarde. Isso ocorre porque a melatonina endógena (do próprio corpo), que é gerada durante a noite, quando o sono se aproxima, está envolvida nas alterações da glicose que ocorrem no metabolismo.

A pesquisa descobriu que comer mais tarde perturbou o controle de açúcar no sangue de todo o grupo. O controle de glicose prejudicado foi observado predominantemente naqueles que possuíam variantes de risco genético, representando cerca de metade da coorte.

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Os autores do estudo acreditam que os resultados do estudo podem ajudar na prevenção do diabetes tipo 2 - iStock

Para os autores, os resultados "podem ser importantes no esforço para a prevenção do diabetes tipo 2". Além disso, eles apontam que as descobertas são aplicáveis a cerca de um terço da população no mundo industrializado, que consome alimentos perto da hora de dormir, bem como outras populações que comem à noite, incluindo trabalhadores em turnos, aqueles que sofrem de jet lag social (fenômeno que ocorre quando há diferenças nos horários de sono dos dias de trabalho e dos fins de semana) ou de distúrbios alimentares noturnos, bem como os que rotineiramente usam suplementos de melatonina perto da hora de consumir alimentos.

Melatonina: papel fundamental no metabolismo da glicose

Os resultados sugerem que as pessoas devem evitar comer duas horas antes de dormir, dizem os pesquisadores. Eles admitem, no entanto, que a pesquisa não incluiu pacientes com diabetes, portanto, estudos adicionais são necessários para examinar o impacto do tempo de alimentação, a ligação com a melatonina e a variação do receptor em pacientes com diabetes.

A melatonina, hormônio liberado principalmente à noite que ajuda a controlar o ciclo sono-vigília, geralmente aumenta cerca de duas horas antes de dormir. A descoberta do MTNR1B como um gene associado ao diabetes tipo 2 “sugere que além do sono e da regulação circadiana, a melatonina desempenha um papel fundamental no metabolismo da glicose”, observaram os autores.

No entanto, se a melatonina melhora ou prejudica o controle da glicose é controverso, e o efeito dos genótipos MTNR1B no controle da glicose não está claro.

Relógio biológico

Andressa Heimbecher, endocrinologista da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, Regional São Paulo, afirma que este estudo é mais um indicando que, ao se ter uma alteração do relógio biológico e aumento da quantidade de alimentação no período noturno, a demanda metabólica aumenta.

Existe uma situação chamada jet lag social, na qual a pessoa dorme pouco durante a semana ou muito tarde e, no fim de semana, tenta compensar. Isso desregula o relógio biológico e altera a produção de hormônios que geram fome ou saciedade, e altera a produção de insulina, causando mais estados de resistência a ela, o que pode levar ao desenvolvimento de diabetes. Este estudo vem ao encontro disso. O paciente, ao ingerir maior quantidade de calorias à noite, faz com que exista uma maior demanda do metabolismo e, com isso, o desalinhamento do relógio biológico. Em pessoas que têm a mutação da melatonina, isso é visto com maior frequência”, afirma a médica.

Qual seria, então, o intervalo recomendado para uma pessoa comer e ir para a cama? Para Andressa, na verdade, o ideal não é pensar no tempo que precisamos para jantar e ir dormir, mas em outras questões como: qual o conteúdo do jantar? Será que ele teve a quantidade correta de carboidratos, por exemplo? Será que não foi exagerado? Que horas eu jantei? Meia-noite? Qual foi a distribuição dos alimentos durante o dia?

“Temos de pensar que o café da manhã e o almoço precisam trazer uma certa quantidade de nutrientes. Já as refeições do fim do dia têm de ser menores para ir de acordo com nosso relógio biológico. Muitas vezes o problema não é o horário que vou jantar, mas o conteúdo dele, se há excesso de calorias e se a pessoa está atrasando o sono por conta do que come”, aponta a médica.

Além da insônia e de prováveis gatilhos para diabetes, quais outros problemas o hábito de comer tarde da noite e ir para a cama em seguida poderiam trazer? Andressa destaca o refluxo. “Que me vem logo à mente, pensando em grandes volumes e quantidade de calorias, é a doença do refluxo. Os pacientes que têm este problema precisam comer pelo menos duas horas antes de deitar e beber líquidos uma hora antes. Mas ressalto que precisamos ver o ritmo do relógio biológico. A pessoa tem de jantar em uma hora que possibilite que ela consiga dormir sempre no mesmo horário, além de conseguir uma rotina de dormir por cerca de sete horas, o correto para um adulto saudável”, finaliza.

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