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Solidão aumenta a vulnerabilidade na internet em tempos de pandemia

Se apaixonar por alguém que a pessoa nunca viu pode indicar uma vulnerabilidade emocional - Freepik
Se apaixonar por alguém que a pessoa nunca viu pode indicar uma vulnerabilidade emocional - Freepik

Jairo Bouer Publicado em 17/03/2021, às 11h24

Você já deve ter ouvido mil e uma histórias sobre gente que sofre – e erra feio – por amor. Se bobear, até mesmo você já meteu os pés pelas mãos porque estava apaixonado ou amando demais, e acabou insistindo em uma relação que claramente não tinha a menor chance de dar certo.

Insegurança, medo de ficar sozinho, crise na autoestima, dependência emocional, manutenção de um status familiar, entre outros fatores, são possíveis mecanismos na base desse “amar sem medir consequências”, sem querer enxergar um palmo à sua frente. 

E o que dizer do fenômeno anterior, sofrer por querer muito amar alguém, mesmo sem nunca ter visto a pessoa? Seria uma espécie de estar um passo antes do amor propriamente dito, mas mesmo assim já no modo “topo fazer qualquer coisa para dar certo”. Talvez uma situação mais incomum, com causas menos claras e óbvias, mas que tem ocupado mais espaço com o distanciamento e o isolamento impostos pela pandemia.

Vulnerabilidade emocional

É significativo discutir essa questão quando esses erros de avaliação podem trazer prejuízos concretos para a existência das pessoas, como perdas financeiras, desmoralização e até risco de vida. Algumas vezes, há uma percepção tão distorcida sobre a realidade do que acontece, que os comportamentos e atitudes namoram com um delírio.

Quem entra em uma armadilha dessas pode estar enfrentando alguma vulnerabilidade emocional. O problema é que hoje existem até mesmo quadrilhas especializadas em identificar pessoas vulneráveis e atacá-las. Um grupo particularmente exposto é o de pessoas solteiras e mais velhas que se sentem solitárias ou buscam um relacionamento que pode mudar suas vidas. As mulheres costumam ser alvos preferenciais.

Quero casar com você!

Semana passada dois novos casos chamaram a atenção. No extremo-oeste catarinense, na cidade de Bandeirante, uma mulher de 40 anos, foi contatada em uma rede social por um suposto homem que morava em Londres (Reino Unido), que dizia estar à procura de uma parceira para se casar.

Em pouco tempo, ganhando a confiança da vítima, os dois já estavam trocando mensagens pelo aplicativo WhatsApp e, então, ele solicitou dados pessoais e endereço para enviar joias. A partir daí uma falsa empresa de logística começou a solicitar depósitos em dinheiro para liberar o presente, pagar taxas alfandegárias e impostos sobre os valores. Depois de depositar cerca de R$ 28 mil reais nas contas identificadas, sem receber os mimos prometidos, a mulher começou a a desconfiar que se tratava de um golpe.

Esse tipo de crime não é incomum e já acontecia antes mesmo da pandemia, só que o tempo prolongado que as pessoas estão passando sozinhas em suas casas, com maior uso de redes sociais e fragilidades emocionais amplificadas pelo isolamento podem estar abrindo mais “brechas”.

Primeiro amor

O maior tempo de uso de telas, a distância dos amigos e a inexperiência afetiva também podem fazer com que os mais jovens caiam em “golpes” do amor. Outra história noticiada pela Folha de S.Paulo na última semana mostrou que um garoto de 18 anos, Matheus de Quadros, apaixonado por uma garota de 16 anos que nunca viu, mas com quem “conversava” há dois anos pelo Facebook, pegou um ônibus em Porto Alegre e foi até São Paulo, em busca da amada virtual.

Sem avisar ninguém, juntou suas economias, comprou uma passagem e um pacote de bolachas e seguiu em frente rumo ao primeiro namoro da sua vida. Ao chegar no Terminal Rodoviário do Tietê na capital paulista começou a mandar mensagens por rede social (a menina nunca quis passar o celular para ele). Não precisa nem dizer que as mensagens não foram respondidas!

Sem dinheiro para voltar, com vergonhas de pedir socorro para conhecidos, o garoto passou fome por três dias na rodoviária, até que lembrou de um PM que havia conhecido anos antes em um curso do programa educacional sobre drogas Proerd. Mesmo à distância, o militar conseguiu acionar uma rede de policiais em São Paulo que prestaram auxílio, fizeram uma “vaquinha” e colocaram o garoto no ônibus de volta para casa.

É curioso notar como, envolvidos em um amor ou uma paixão que só eles mesmos enxergam, muitas vezes, enganados por quadrilhas e perfis “fakes”, homens e mulheres embarcam na canoa furada dessas aventuras românticas.

Acreditam que a sua vez chegou e que é hora de ser feliz. Ficam resistentes a alertas dos amigos mais próximos e familiares. A partir de um determinado ponto podem até deixar de dividir o que está acontecendo por medo de críticas (afinal, os outros não entenderiam o que ele ou ela sente!)

Não que um grande amor não possa nascer nas redes sociais e em aplicativos de encontro. Mas em momentos de vulnerabilidades, incertezas e solidão como esses que estamos vivendo, os riscos de se avaliar mal e de errar no campo afetivo aumentam muito. Abra bem os olhos, seus e dos amigos, tome cuidado, e preste atenção para não sofrer por algo ou alguém que talvez nem exista fora da sua cabeça!  

(Texto extraído da coluna do Jairo Bouer no UOL VivaBem)

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