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Quanto tempo pode durar a “fase terminal” de um relacionamento?

Segundo pesquisadores, o fim de um relacionamento envolve duas fases distintas - iStock
Segundo pesquisadores, o fim de um relacionamento envolve duas fases distintas - iStock

O fim de um relacionamento amoroso dificilmente é um evento inesperado. Ainda que para amigos e parentes possa parecer repentino, o casal com frequência percebe logo quando as coisas vão mal. Ou pelo menos uma das partes. 

Um novo estudo publicado no Journal of Personality and Social Psychology descobriu que a satisfação no relacionamento tende a diminuir gradualmente no início. Mas a queda é bem acentuada cerca de um a dois anos antes da separação.

Antes do divórcio

Esse padrão de “declínio terminal” foi consistente em grandes amostras de quatro estudos europeus, destacando como o desgaste de um relacionamento geralmente começa muito antes da decisão final de terminar.

Os pesquisadores estavam interessados em entender melhor como os relacionamentos amorosos mudam ao longo do tempo – especificamente, o que acontece no período que antecede uma separação.

Estudos anteriores já tinham analisado a queda de satisfação nos primeiros anos de um relacionamento. Mas, neste trabalho, os pesquisadores fizeram uma pergunta diferente: o que acontece com a satisfação quando olhamos para a proximidade do fim da relação?

Inspiração no envelhecimento

A ideia foi inspirada em pesquisas sobre envelhecimento, que mostram que o bem-estar geralmente cai bruscamente nos anos que antecedem a morte – um padrão conhecido como “declínio terminal”.

A equipe aplicou esse conceito aos relacionamentos românticos, questionando se algo semelhante poderia ocorrer nos anos que antecedem uma separação.

Para explorar essa ideia, os pesquisadores Janina Larissa Bühler e Ulrich Orth analisaram dados de quatro estudos longitudinais de grande escala, nacionalmente representativos, realizados na Alemanha, Austrália, Reino Unido e Holanda.

Dados coletados anualmente

Esses estudos acompanharam milhares de indivíduos por muitos anos, coletando anualmente informações sobre suas vidas amorosas, incluindo satisfação no relacionamento e se houve ou não separação.

No total, foram analisados dados de mais de 15.000 pessoas que passaram por uma separação e comparados a um grupo semelhante de indivíduos que permaneceram em seus relacionamentos.

Para garantir comparações justas, os pesquisadores usaram uma técnica estatística chamada propensity score matching. Esse método ajudou a controlar diferenças pré-existentes entre os que eventualmente terminaram e os que não terminaram, como idade, traços de personalidade, renda, nível de escolaridade e satisfação inicial no relacionamento.

Isso permitiu atribuir com mais segurança as mudanças observadas na satisfação ao processo de separação, e não a outros fatores.

Duas fases distintas

O foco principal da análise foi examinar como a satisfação mudou em relação ao momento da separação. Em vez de observar como a satisfação mudou ao longo de todo o relacionamento, eles focaram nos anos que antecederam o fim da relação — uma medida que chamaram de “tempo até a separação”.

Ao traçar esses dados, eles encontraram um padrão claro e consistente: a satisfação diminuía em duas fases distintas. Primeiro, havia uma queda lenta e gradual, que durava vários anos.

Depois vinha uma queda mais acentuada, que começava aproximadamente um a dois anos antes do término. Essa segunda fase, chamada de “fase terminal”, marcava um período de deterioração rápida.

Fase terminal é longa

Nos diferentes conjuntos de dados, o início dessa fase terminal variou um pouco, com a queda mais acentuada geralmente começando entre sete meses e pouco mais de dois anos antes do término.

Esses achados sugerem que muitos relacionamentos começam a se desintegrar muito antes de o casal realmente se separar.

E a satisfação com a vida?

Os pesquisadores também compararam esse padrão com mudanças na satisfação geral com a vida. Embora a satisfação com a vida também tendesse a diminuir antes do término, a mudança foi muito menor e menos consistente do que a observada na satisfação com o relacionamento.

Isso reforça a ideia de que o declínio terminal é mais específico ao relacionamento do que a um declínio geral no bem-estar.

Quem toma a iniciativa

O estudo também explorou diferenças importantes entre pessoas que iniciaram o término e aquelas que foram deixadas.

Em um dos conjuntos de dados, os que tomaram a iniciativa da separação mostraram sinais de insatisfação mais cedo, iniciando o declínio terminal mais de um ano antes do fim.

Já aqueles que foram deixados muitas vezes não demonstravam queda significativa na satisfação até bem perto do término — às vezes apenas alguns meses antes.

No entanto, uma vez iniciada a queda na satisfação desses indivíduos, ela ocorria de forma mais rápida do que entre os que iniciaram o término.

Estar casado faz diferença?

Os pesquisadores também analisaram se outros fatores, como idade, gênero, estado civil e experiências anteriores de relacionamento, influenciavam as mudanças na satisfação.

Mas os resultados variaram. Por exemplo: em alguns casos, estar casado parecia proteger contra um declínio terminal acentuado, enquanto em outros, parecia intensificá-lo. Gênero e experiências prévias de relacionamento não tiveram efeitos consistentes.

Quando o esforço deixa de funcionar

Esses achados sugerem que, embora muitos casais passem por um desgaste lento da satisfação ao longo do tempo, a transição para um término inevitável frequentemente se acelera significativamente nos últimos um a dois anos.

Esse período de declínio rápido pode refletir o aumento de conflitos, o desligamento emocional ou a percepção de que os esforços para salvar o relacionamento já não estão funcionando.

Limitações do trabalho

Embora o estudo tenha sido abrangente, ele apresenta algumas limitações. Todos os quatro conjuntos de dados vieram de países ocidentais, portanto os resultados podem não se aplicar da mesma forma em contextos culturais diferentes.

Além disso, apesar de os dados cobrirem longos períodos e incluírem muitos participantes, foram baseados em autorrelatos, que podem ser afetados por vieses de memória ou mudanças na forma como as pessoas interpretam suas experiências.

Os pesquisadores também observaram que coletas de dados mais frequentes – como avaliações mensais em vez de anuais – poderiam oferecer uma visão mais detalhada de como os estágios finais de um relacionamento se desenrolam.

Referência

“Terminal Decline of Satisfaction in Romantic Relationships: Evidence from Four Longitudinal Studies”. Janina Larissa Büler e Ulrich Orth. Journal of Personality and Social Psychology. 2025

Tatiana Pronin

Tatiana Pronin

Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY. Twitter: @tatianapronin