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Somos capazes de prever que um relacionamento não vai durar?

Você já sabia que o relacionamento não ia dar certo? É melhor pensar duas vezes antes de dizer isso - iStock
Você já sabia que o relacionamento não ia dar certo? É melhor pensar duas vezes antes de dizer isso - iStock

Você já pensou ou disse algo do tipo “Eu sabia que não ia dar certo”, ao ouvir sobre o rompimento de um casal que você conhece? Ou até da sua própria consciência, após uma separação? 

Segundo um estudo norte-americano, publicado na revista acadêmica de acesso aberto Social Psychological Bulletin, isso não significa que você é um expert em relacionamentos; muito menos que sabe ler o futuro. 

Na maioria das vezes, o que acontece é que as pessoas têm um viés de retrospectiva, e acham que sabiam de algo, quando, na verdade, não sabiam. Ou seja, é só uma "pegadinha" da sua memória

Como funciona o viés de retrospectiva

Uma equipe de pesquisa da Universidade de Wisconsin-Eau Claire, nos EUA, realizou uma série de pesquisas com mais de 1.000 estudantes universitários e adultos. E concluiu que somente depois de saber da separação de um casal é que a pessoa percebe que aquilo era óbvio, porque passa a focar nas qualidades negativas daquele relacionamento

Para testar o papel do viés retrospectivo, os pesquisadores realizaram dois estudos. Em ambos, eles deram a cada um dos participantes uma história que descrevia um casal aparentemente feliz e amoroso, com diversas qualidades, como uma grande conexão emocional, mas também uma série de empecilhos, como diferentes crenças religiosas.

Em cada estudo, os entrevistados foram divididos em três grupos. Cada um recebia informações diferentes sobre o status do relacionamento do casal seis meses depois. Um grupo não recebeu nenhuma informação. Outro foi informado de que o casal tinha se separado. E o terceiro grupo recebeu um resultado positivo: que o casal simplesmente “permaneceu junto” (no primeiro estudo) ou “ficou noivo” (no segundo).

Os pesquisadores queriam descobrir se as pessoas avaliariam o casal e seu relacionamento de maneira diferente quando soubessem que o casal havia se separado.

Como as pessoas reagiram na pesquisa

Depois que os entrevistados receberam todo o cenário fictício, eles foram questionados sobre como achavam que o relacionamento se desenvolveria ao saber, pela primeira vez, sobre o casal. Eles também foram convidados a avaliar a qualidade do relacionamento descrito.

Como resultado, não houve muita diferença nas respostas entre os grupos que receberam nenhuma informação ou um cenário positivo. No entanto, houve um grande contraste entre esses dois grupos e o grupo que foi informado de que o casal tinha se separado. Esses classificaram o relacionamento do casal de forma mais negativa.

Previsões anteriores são reinterpretadas

Os pesquisadores sugerem que, uma vez que descobrem sobre a separação, os sinais do rompimento iminente que foram ignorados na previsão inicial podem se tornar mais relevantes.

Segundo os pesquisadores, à medida que os indivíduos atualizam seus conhecimentos e usam as informações recém-adquiridas para dar sentido às experiências, eles podem esquecer ou reinterpretar pensamentos e previsões anteriores. 

É como se a memória fosse reconstruída, com mais peso colocado nos elementos negativos do relacionamento. Da mesma forma, certos aspectos da relação podem ser reinterpretadas para dar sentido ao resultado. Por exemplo: o que antes era interpretado como atenção e afeto constantes pode ser reinterpretado como carência excessiva de um dos parceiros. Da mesma forma, as diferenças de crenças que antes eram interpretadas como oportunidades interessantes podem ser revistas como barreiras intransponíveis.

Na conclusão, a equipe aponta para seus dados como evidência de que se culpar após o término de um relacionamento, ou ouvir de amigos e parentes o famoso "eu sabia que não ia dar certo", é algo que não faz sentido. E só aumenta o risco de depressão e ansiedade após a separação. 

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Tatiana Pronin

Tatiana Pronin

Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY e é membro da Association of Health Care Journalists. Twitter: @tatianapronin