Doutor Jairo
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Estudo mostra como terapia ajuda crianças com ansiedade

A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é considerada o padrão ouro no tratamento da ansiedade - iStock
A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é considerada o padrão ouro no tratamento da ansiedade - iStock

Pesquisadores dos Instituto Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês) encontraram características específicas no cérebro de crianças com transtornos de ansiedade que não tomam remédios. Além disso, eles mostraram que o tratamento com terapia cognitivo-comportamental (TCC) resultou em melhorias nos sintomas clínicos e no funcionamento cerebral.

As descobertas ajudam a esclarecer os mecanismos cerebrais ligados à eficácia da TCC para tratar um dos transtornos mentais mais comuns. Elas foram publicadas no American Journal of Psychiatry, por pesquisadores do Instituto Nacional de Saúde Mental, que faz parte do NIH.

"Sabemos que a TCC é eficaz. Essas descobertas nos ajudam a entender como a TCC funciona, um passo crítico para melhorar os resultados clínicos", afirmou a autora do estudo Melissa Brotman, chefe da Unidade de Neurociência e Novas Terapias no Programa de Pesquisa Intramural do NIMH.

O trabalho contou com 69 crianças não medicadas e diagnosticadas com transtorno de ansiedade, que passaram por 12 semanas de TCC, seguindo um protocolo estabelecido. Este tipo de terapia envolve a mudança de pensamentos e comportamentos disfuncionais por meio da exposição gradual a estímulos que provocam ansiedade. Ela é considerada o padrão ouro no tratamento da ansiedade em crianças. 

Os pesquisadores utilizaram medidas específicas para examinar a mudança nos sintomas de ansiedade e no funcionamento clínico das crianças antes e depois do tratamento. Eles também utilizaram ressonância magnética funcional baseada em tarefas para analisar as mudanças em todo o cérebro, e compararam os resultados com os de 62 crianças da mesma idade sem sintomas de ansiedade. 

Ansiedade e atividade cerebral 

Crianças com ansiedade apresentaram maior atividade em muitas regiões cerebrais, incluindo áreas corticais nos lobos frontal e parietal, que são importantes para funções cognitivas e regulatórias, como atenção e regulação emocional. Os pesquisadores também observaram uma atividade elevada em áreas límbicas mais profundas, como a amígdala, que são essenciais para gerar emoções intensas, como ansiedade e medo.

Após três meses de tratamento com TCC, as crianças com ansiedade apresentaram uma diminuição significativa nos sintomas e um funcionamento aprimorado. A ativação aumentada observada antes do tratamento em muitas regiões cerebrais frontal e parietal também melhorou após a TCC, diminuindo para níveis iguais ou inferiores aos das crianças não ansiosas.

No entanto, oito regiões cerebrais, incluindo a amígdala direita, continuaram a mostrar uma atividade mais alta em crianças ansiosas em comparação com as não ansiosas. Esse padrão persistente de ativação intensificada sugere que algumas regiões cerebrais, especialmente áreas límbicas que modulam respostas a estímulos que provocam ansiedade, podem ser menos responsivas aos efeitos agudos da TCC. Alterar a atividade nessas regiões pode exigir uma duração maior de TCC, ou formas adicionais de tratamento. 

Compreender o circuito cerebral subjacente aos sentimentos de ansiedade intensa e determinar quais circuitos se normalizam e quais não, à medida que os sintomas de ansiedade melhoram com a terapia, é crucial para avançar no tratamento e torná-lo mais eficaz para todas as crianças, segundo a equipe. 

Crianças com tendência à ansiedade

Neste estudo, todas as crianças com ansiedade receberam TCC. Para fins de comparação, os pesquisadores também mediram a atividade cerebral em uma amostra separada de 87 jovens com alto risco de ansiedade com base no temperamento (eles tinham, por exemplo, uma sensibilidade alta a situações novas). Como essas crianças não foram diagnosticadas com transtorno de ansiedade, elas não receberam tratamento com TCC. As imagens cerebrais foram tiradas aos 10 e 13 anos.

Em adolescentes apenas com risco de ansiedade, uma maior atividade cerebral estava relacionada ao aumento dos sintomas ao longo do tempo e correspondia à atividade cerebral vista em crianças diagnosticadas com o transtorno. Isso fornece evidências preliminares de que as mudanças cerebrais podem oferecer um marcador neural confiável do tratamento da ansiedade.

Tratar na infância é mais fácil 

Os transtornos de ansiedade são comuns em crianças e podem causar significativo desconforto em situações sociais e acadêmicas. Eles também são crônicos, com uma forte ligação na vida adulta, quando se tornam mais difíceis de tratar.

Apesar da eficácia da TCC, muitas crianças continuam a apresentar sintomas de ansiedade após o tratamento. Aprimorar a terapia para tratar a ansiedade de maneira mais eficaz durante a infância pode trazer benefícios a curto e longo prazo, bem como prevenir problemas mais graves mais tarde.

Dr. Jairo Bouer

Dr. Jairo Bouer

Médico psiquiatra com formação na Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), biólogo pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), e mestre em evolução humana e comportamento pela University College London, além de palestrante e escritor. Twitter: @JairoBouerDr