Quando um corredor começa a levar o treinamento mais a sério, o desejo por resultados expressivos se torna um objetivo central. Superar marcas pessoais, aumentar a distância percorrida ou participar de provas, como meias-maratonas e maratonas, exige comprometimento.
Mas, à medida que o volume semanal de corrida cresce, muitos negligenciam um fator crucial: a importância de correr leve, ou como é popularmente chamado, “correr fofo”. Embora treinos intensos, como intervalados e fartlek, sejam essenciais para desenvolver velocidade e potência, não é possível evoluir sem equilibrar a carga de esforço com treinos leves.
De acordo com Emídio Peres, profissional de educação física e pós-graduado em biomecânica e fisiologia do exercício, o tipo de treinamento varia muito entre iniciantes e corredores avançados. Ele explica que os iniciantes precisam de maior recuperação devido ao impacto da corrida.
“O iniciante na corrida não vai correr todos os dias. Ele precisa ter mais descanso de uma sessão para outra, até pelo fato de a corrida ser um esporte de impacto e, sendo ele iniciante, ele não tem as estruturas muscular, de tendão e de ligamento prontas para receberem esse tipo de impacto.”
No entanto, para corredores experientes que buscam performance, o cenário é diferente. Com a progressão no esporte, é possível treinar quase todos os dias, desde que o planejamento seja bem estruturado. “Pessoas de nível avançado podem fazer treinos de corrida todos os dias, dependendo da fase da preparação, do objetivo e das orientações do treinador. Mas essa é uma pequena parcela das pessoas que correm”, ressalta Peres.
Os treinos leves, embora pareçam simples, têm um papel determinante no progresso do corredor. “Ao ter um maior volume de treino pensando em uma maratona, por exemplo, isso vai favorecer com que você desenvolva várias capacidades, tanto em treinos mais leves quanto em treinos mais intensos. Você consegue desenvolver as diferentes necessidades pra, por exemplo, fazer uma corrida ou uma maratona num ritmo mais rápido”, explica o treinador.
Ele cita o exemplo de corredores de elite que acumulam até 200 km semanais em preparações para provas longas. “Para ‘pessoas normais’, 70 km ou 80 km semanais já é um volume bem considerável. Já iniciantes podem se beneficiar com um volume semanal de treino de 20 km a 30 km, o que já traz adaptações importantes.”
Treinar em um ritmo leve ajuda a melhorar a capacidade aeróbica e a eficiência metabólica. Durante esses treinos, o corpo aprende a usar gorduras como principal fonte de energia, em vez de glicogênio, o que é especialmente útil em corridas longas. Além disso, o impacto reduzido evita sobrecarga muscular, permitindo que os treinos mais intensos sejam realizados com qualidade.
Outro benefício é o desenvolvimento das mitocôndrias, conhecidas como “usinas de energia” das células. Treinos leves aumentam o número e a eficiência dessas estruturas, o que melhora a resistência geral do corpo. Além disso, o fortalecimento do sistema cardiovascular reduz a frequência cardíaca de repouso e melhora a capacidade do coração de bombear mais sangue com menos esforço.
Para garantir que o treino leve seja feito de forma adequada, o corredor deve monitorar sua frequência cardíaca. Esse tipo de treino deve ser realizado com a frequência cardíaca entre 60% e 70% da frequência cardíaca máxima (FCM).
A fórmula mais comum para calcular a FCM é: 220 - sua idade. Por exemplo, para uma pessoa de 40 anos, a FCM seria 180 bpm (batimentos por minuto). Assim, a zona de treino leve ficaria entre 108 e 126 bpm (lembrando que esta é uma fórmula genérica e sem uma precisão individualizada).
Caso o corredor não tenha um monitor cardíaco, uma dica prática é o “teste da conversa”. Durante o treino leve, você deve ser capaz de falar frases completas sem dificuldade. Se estiver ofegante, é um sinal de que está correndo mais rápido do que deveria.
Se o objetivo é melhorar o desempenho, incluir treinos leves na rotina não significa abrir mão de intensidade, mas sim equilibrar os estímulos. Veja como incorporar essa prática no seu plano de treinos:
Correr devagar é uma estratégia fundamental para quem busca correr rápido. Ao desacelerar em boa parte dos treinos, o corpo se adapta às demandas do esporte de forma saudável, melhorando a resistência e permitindo que os treinos intensos sejam realizados com máxima qualidade.
Se você quer atingir um novo patamar na corrida, abrace a ideia de “correr fofo”. O equilíbrio entre intensidade e leveza pode ser o segredo para superar suas metas e se manter no esporte por muitos anos.
Fausto Fagioli Fonseca
Formado em jornalismo e pós-graduado em jornalismo esportivo, atua na área de esportes e saúde desde 2008. @faustoffonseca