Muita gente que acredita ter sintomas depressivos, ou mesmo quem recebe o diagnóstico, vai atrás de um tratamento não medicamentoso para tentar obter alguma melhora, pelo menos no início.
Nesse cenário, é comum as pessoas recorram aos chamados medicamentos de venda livre, que não requerem receita médica, como é o caso da chamada “erva-de-São João” ou mesmo os suplementos de ômega-3.
Mas, afinal, esses produtos realmente funcionam? Uma equipe de pesquisadores de universidades no Reino Unido, Peru e China decidiu analisar estudos clínicos com suplementos que, supostamente, ajudam no controle da depressão. Os resultados foram publicados no periódico Frontiers of Pharmacology.
Os pesquisadores revisaram 23.933 registros de estudos e 1.367 artigos científicos. No total, encontraram 209 ensaios clínicos (a maneira mais confiável de se avaliar a eficácia e segurança de algo).
Nada menos que 64 diferentes produtos de venda livre que foram avaliados para a depressão, com diferentes níveis de evidência para cada um.
Foram incluídos estudos com adultos entre 18 e 60 anos com sintomas ou diagnóstico de depressão. Eles analisaram separadamente estudos somente com pessoas idosas, para eliminar o viés.
Uma dificuldade encontrada pela equipe foi classificar os produtos de venda livre, já que diferentes países têm regulamentações diferentes, e alguns produtos são comuns em certos lugares, mas não em outros.
No final, foi preciso restringir as escolhas, excluindo alguns produtos considerados muito peculiares, como pó de cabeça de enguia, por exemplo.
Não foi fácil avaliar tudo – alguns estudos testavam múltiplas doses ou produtos, outros eram combinados com antidepressivos, e em alguns trabalhos os participantes tinham outras condições físicas além da depressão.
Os pesquisadores agruparam as descobertas em três categorias:
1) produtos com evidência substancial (mais de 10 ensaios);
2) evidência emergente (entre 2 e 9 ensaios);
3) produtos com apenas um ensaio clínico (ou seja, pouca evidência).
Os produtos com evidência substancial são bem conhecidos do público leigo:
- ômega-3 (39 ensaios clínicos);
- erva-de-São-João (38);
- probióticos (18);
- vitamina D (14);
- açafrão (18).
Resultados da análise
Veja o que os pesquisadores concluíram a partir dos dados:
- Comparado ao placebo, poucos ensaios com ômega-3 encontraram efeitos sobre a depressão.
- A erva-de-São-João e o açafrão mostraram efeitos positivos com mais frequência que o placebo e resultados semelhantes a alguns antidepressivos prescritos.
- Probióticos e vitamina D também foram mais propensos a reduzir sintomas depressivos do que o placebo.
- Dos 18 produtos com evidência emergente, ácido fólico, lavanda, zinco, triptofano, rodiola e melissa foram considerados os mais promissores.
- Laranja amarga, lavanda persa e chá de camomila também mostraram alguns efeitos positivos em dois estudos cada.
- Alguns produtos que estão ganhando popularidade, como melatonina, magnésio e curcumina, mostraram efeitos mistos sobre a depressão em vários ensaios clínicos.
- Resultados mistos também foram encontrados para canela, echium (tipo de flor), vitamina C e a combinação de vitamina D com cálcio.
- Prebióticos (compostos que apoiam as bactérias benéficas do intestino) e um suplemento chamado SAMe não se mostraram melhores que o placebo.
- Do total, 41 produtos tinham apenas um ensaio disponível, por isso não fornecem evidência conclusiva.
A boa notícia, segundo os pesquisadores, é que as pesquisas apontaram poucos problemas com a segurança desses produtos, quer fossem tomados isoladamente ou em combinação com antidepressivos.
No entanto, os autores ressaltam que um profissional de saúde deve sempre ser consultado para avaliar possíveis contraindicações ou interações com outros medicamentos. A erva-de-são-joão, por exemplo, é conhecida por interferir na eficácia de outros remédios, inclusive da pílula anticoncepcional!
à equipe também alerta que um padrão mais alto de relato de segurança nos ensaios é essencial – apenas 69% dos estudos analisados relataram completamente os efeitos colaterais dos produtos.
Embora 89 ensaios tenham testado produtos em combinação com antidepressivos, poucos investigaram se tomar produtos de venda livre junto com a psicoterapia pode gerar um efeito adicional. Também é importante saber se o uso desses compostos pode trazer algum tipo de economia para o sistema de saúde.
Por fim, há muitos fitoterápicos usados para depressão para os quais ainda não existe nenhum tipo de evidência científica, e que precisam ser estudados. Lembre-se: “natural” não significa livre de efeitos colaterais.
Além disso, plantas medicinais e suplementos podem trazer prejuízos para o seu bolso e adiar a busca por tratamentos mais eficazes, o que pode prolongar o sofrimento de forma desnecessária.
Tatiana Pronin
Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY. Twitter: @tatianapronin