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Mamografia regular deve começar aos 40 anos, decidem EUA

Revisão deve reduzir a confusão que existia por causa de recomendações contraditórias - iStock
Revisão deve reduzir a confusão que existia por causa de recomendações contraditórias - iStock

Alarmadas com o aumento no diagnóstico de câncer de mama entre mulheres mais jovens, além das taxas de mortalidade mais altas entre as mulheres negras, autoridades médicas nos EUA divulgaram uma revisão dos protocolos em relação às mamografias nesta terça-feira (8).

Mulheres de todas as origens raciais e étnicas que têm um risco médio para câncer de mama  devem começar a fazer mamografias regulares aos 40 anos, em vez de tratar isso como uma decisão individual até os 50 anos, como vinha sendo recomendado antes, de acordo com o Grupo de Trabalho de Serviços Preventivos daquele país.

Como é no Brasil?

A Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), o Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) também recomendam a mamografia anual para as mulheres a partir dos 40 anos de idade. O Ministério da Saúde, no entanto, preconiza o rastreamento bianual, a partir dos 50 anos, excluindo dos programas de rastreamento uma faixa importante da população (mulheres entre 40-49 anos), responsável por cerca de 15-20% dos casos de câncer de mama, segundo a SBM.

A visão que regia o protocolo anterior dos norte-americanos, também adotada pelo Ministério da Saúde, era a de que a triagem precoce poderia fazer mais mal do que bem, levando a tratamentos desnecessários em mulheres mais jovens, incluindo biópsias que se mostraram negativas.

Tendência atual é preocupante

No entanto, as tendências, nos últimos anos, tornaram-se mais preocupantes: há um aparente aumento no número de cânceres diagnosticados em mulheres com menos de 50 anos. Além disso, os EUA não têm conseguido reduzir uma disparidade importante: a taxa de mulheres negras mais jovens que morrem de câncer de mama é o dobro da observada em mulheres brancas da mesma idade.

"Realmente não sabemos por que houve um aumento no câncer de mama entre mulheres na faixa dos 40 anos", afirmou a especialista Carol Mangione, ex-presidente do grupo de trabalho, em entrevista ao The New York Times. "Mas quando mais pessoas em determinado grupo etário estão desenvolvendo uma condição, a triagem desse grupo terá um impacto maior".

Os diagnósticos de câncer de mama em mulheres na faixa dos 40 anos aumentaram menos de 1% entre 2000 e 2015 nos EUA. Mas a taxa aumentou em média 2% ao ano entre 2015 e 2019, informa a reportagem.

As razões não são claras. O adiamento da gravidez ou a decisão de não ter filhos pode estar impulsionando o aumento, segundo Rebecca Siegel, diretora científica sênior de pesquisa de vigilância na Sociedade Americana do Câncer. É que ter filhos antes dos 35 anos reduz o risco de câncer de mama, assim como amamentar

Ainda assim, ela observou que há muita variação ano a ano nas taxas de diagnóstico. Outros pesquisadores sugerem que o aumento entre mulheres mais jovens pode simplesmente refletir o fato de mais gente fazer mais exames. Triagens frequentes podem causar danos, levando a biópsias desnecessárias que causam ansiedade e tratamento para cânceres de crescimento lento que nunca teriam representado risco de vida, afirmam alguns pesquisadores.

No entanto, em 2009, quando o grupo de trabalho recomendou que as mulheres começassem a fazer mamografias regulares a partir dos 50 anos, houve muitas críticas. Médicos e também pacientes temiam que doenças malignas ficassem sem diagnóstico entre as mulheres mais jovens. Segundo os críticos, a necessidade de reduzir custos é o que tinha impulsionado a recomendação.

Na época, o painel também pediu intervalos mais longos entre as mamografias: uma a cada dois anos, em vez de exames anuais, e essa recomendação ainda é válida. Mas a Sociedade Americana do Câncer diverge neste ponto. As mulheres de 40 a 44 anos devem poder escolher a triagem, diz a sociedade, mas a partir dos 45 anos, as mulheres devem fazer mamografias todos os anos até os 55 anos, quando o risco de câncer de mama começa a diminuir.

Karen Knudsen, diretora executiva da sociedade, disse que recebeu de braços abertos o novo conselho do grupo de trabalho para iniciar a triagem de rotina em idade mais jovem, pois isso vai aliviar a confusão resultante de recomendações contraditórias de grupos médicos. Ela reforça a importância da triagem anual, já que tumores em mulheres pré-menopáusicas crescem mais rapidamente.

Recomendação é para todas as pessoas designadas como mulheres ao nascer

A nova recomendação do grupo se aplica a todas as pessoas designadas como mulheres ao nascer, que estejam assintomáticas e em risco médio de câncer de mama, incluindo aquelas com tecido mamário denso e histórico familiar de câncer de mama.

Mas o conselho não se aplica a quem já teve câncer de mama, carrega mutações genéticas que aumentam seu risco, teve lesões mamárias identificadas em biópsias anteriores ou recebeu radiação de alta dose no tórax, o que aumenta o risco de câncer. Essas mulheres devem consultar seus médicos sobre com que frequência devem fazer a triagem.

O grupo também enfatizou que é importante para as mulheres negras começarem a fazer mamografias aos 40 anos, já que elas têm mais probabilidade de desenvolver tumores agressivos mais cedo e 40% mais risco de morrer de câncer de mama do que as mulheres brancas.

Alguns cientistas têm defendido afastar-se de uma abordagem universal e única para a triagem em favor de uma abordagem "adaptada ao risco", o que significaria fazer triagem em mulheres negras seis a oito anos mais cedo do que em mulheres brancas.

Mas a expectativa dos especialistas é que a triagem, por si só, não vai melhorar as taxas de sobrevivência das mulheres negras, que não apenas têm maior probabilidade de desenvolver tumores agressivos, mas também enfrentam atrasos na obtenção de cuidados médicos e circunstâncias de vida que dificultam o tratamento. Algo que também vemos no Brasil.

Tatiana Pronin

Tatiana Pronin

Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY e é membro da Association of Health Care Journalists. Twitter: @tatianapronin