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Cetamina pode aliviar depressão resistente em 4 horas, aponta estudo

Alguns pacientes não respondem bem aos medicamentos ou terapias típicas que os médicos usam para tratar a depressão - iStock
Alguns pacientes não respondem bem aos medicamentos ou terapias típicas que os médicos usam para tratar a depressão - iStock

Redação Publicado em 14/10/2022, às 12h00

Um novo estudo publicado na Jama Psychiatry procurou examinar como o uso da cetamina  poderia ajudar as pessoas com depressão resistente ao tratamento. Foi descoberto que o uso da substância auxiliou alguns participantes a mudar suas crenças negativas e a obterem um declínio nos sintomas depressivos. A cetamina é usada há bastante tempo como anestésico geral em cirurgias, porém se transformou, também, em uma droga recreativa, por causa dos seus efeitos alucinógenos, gerando a sensação de quem a usa de “estar fora do corpo”.

A depressão, todos sabemos, afeta milhões de pessoas no mundo, mas o transtorno pode ser um desafio para o tratamento. Alguns pacientes não respondem bem aos medicamentos ou terapias típicas que os médicos usam para tratar a depressão. Portanto, os especialistas estão constantemente pesquisando novas maneiras de ajudar a melhorar as opções de tratamento.

Impacto da depressão

A depressão é um transtorno de humor psiquiátrico que pode causar vários sintomas, incluindo sentimentos persistentes de vazio, desesperança ou inutilidade. Milhões de adultos são afetados por ela a cada ano. Crenças negativas como 'eu não valho nada', 'não sou digno de ser amado' ou 'eu sou um fracasso' são sintomas comuns da doença. Quando um paciente começa a entrar em espiral de pensamentos negativos, isso pode exacerbar a depressão, aumentando essas crenças. Tudo isso vira um ciclo vicioso que requer tratamento para ser quebrado: em geral, feito com medicação, psicoterapia e um forte apoio.

A equipe do estudo, liderada por Philippe Fossati e Liane Schmidt, pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisa Médica e de Saúde, da França, observou que as pessoas com depressão podem não só ter opiniões negativas sobre si mesmas, sobre o mundo ao redor como também ter expectativas negativas sobre o futuro, mesmo quando são apresentadas com evidências que não confirmam essas crenças negativas. Em contraste, pessoas sem depressão têm maior probabilidade de atualizar suas crenças quando recebem informações positivas, o que é chamado de viés de otimismo.

O tratamento da depressão pode envolver uma combinação de medicação e terapia. Entretanto, pode persistir para algumas pessoas, ou o paciente pode não responder positivamente a certos medicamentos. As pesquisas estão em andamento sobre como tratar a depressão de forma eficaz. E uma área de interesse é como a cetamina, geralmente usada como anestésico, poderia ser usada no tratamento da depressão.

Os efeitos antidepressivos da cetamina

Os pesquisadores deste estudo procuraram analisar como a cetamina poderia influenciar as crenças negativas entre as pessoas com depressão. Foi um estudo observacional de casos-controle que incluiu 56 participantes - 30 controles e 26 pessoas com depressão resistente ao tratamento. Aqueles com depressão resistente a tratamento preenchiam critérios específicos, incluindo não responder a pelo menos dois tratamentos antidepressivos anteriores. Esses receberam três infusões totais de cetamina durante uma semana: a segunda 48 horas após a primeira, e a terceira cinco dias depois. Os pesquisadores observaram os participantes 24 horas antes de sua primeira infusão, quatro horas depois e quatro horas após a terceira infusão.

Todos os participantes trabalharam por meio de tarefas de atualização de crenças. Os pesquisadores apresentaram aos participantes uma variedade de eventos de vida adversos e pediram que estimassem sua probabilidade de experimentar esses eventos em sua vida. Em seguida, os participantes receberam informações factuais sobre a probabilidade de que esses eventos ocorram na população em geral. Os pesquisadores descobriram que aqueles com depressão resistente ao tratamento tinham uma maior capacidade de atualizar positivamente certas crenças após o tratamento com cetamina. Esta mudança foi ainda mais associada à diminuição dos sintomas depressivos.

Liane Schmidt, uma das autoras do estudo, afirmou que cada paciente foi observado antes e depois da cetamina e que neles foi encontrado um efeito cognitivo precoce nas crenças sobre o futuro. Os pacientes começaram a mostrar um viés otimista na atualização de crenças quatro horas após a primeira infusão. Em uma semana de tratamento, o viés otimista na atualização de crenças estava correlacionado a um efeito clínico antidepressivo.

Limitações e áreas para pesquisa contínua

O estudo ofereceu uma visão de como a cetamina poderia ser usada para expandir as opções de tratamento para pessoas com depressão. No entanto, o estudo também tinha várias limitações. Primeiro, não foi um estudo cego ou randomizado, o que pode ter impacto nos resultados do estudo. Também incluía um pequeno tamanho de amostra e só se realizou durante uma semana, indicando a necessidade de estudos com amostras maiores e tempos de acompanhamento mais longos.

A pesquisa não pode confirmar que os efeitos da cetamina são exclusivos para pessoas com depressão resistente ao tratamento. Os participantes também receberam o tratamento antidepressivo normal durante o estudo. Os pesquisadores reconhecem que outros antidepressivos também poderiam influenciar a atualização de crenças ou o trabalho, influenciando outras funções. Assim, os autores admitem que mais pesquisas sobre os mecanismos subjacentes aos medicamentos antidepressivos e à cetamina são necessários.

Em geral, os resultados poderiam abrir novas estratégias de tratamento para alguns indivíduos com depressão. No entanto, é preciso cautela, segundo alguns neuropsiquiatras, pois a infusão de cetamina está disponível, mas não é comumente usada. Normalmente, é reservada apenas à depressão resistente ao tratamento e só pode ser feita em instalações que oferecem infusão intravenosa e podem monitorar os pacientes, algo próximo a um centro de diálise. A cetamina é também uma substância controlada com riscos inerentes. É essencial também entender que a infusão de cetamina não substituirá a terapia cognitiva e farmacoterapia convencional para depressão.

Liane Schmidt estava otimista sobre as conclusões do estudo e a possibilidade de novos tratamentos nesta área. Para ela, estas descobertas sugerem que a psicoterapia com medicamentos (como a cetamina) poderia ser uma boa ideia para o tratamento da depressão. Isso significa que a cetamina 'abre a porta' para informações positivas que 'desconfirmam' as fortes crenças negativas sobre o futuro que fazem parte da chamada tríade cognitiva da depressão e mantêm a doença. Se esta porta se abrir, os pacientes podem se tornar mais receptivos a sugestões destinadas a 'desconfirmar' suas ruminações e, por meio dela, combater a doença.

Fonte: MedicalNewsToday

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