Redação Publicado em 12/08/2025, às 10h00
Um estudo da Universidade Flinders, na Austrália, revela por que perdoar a si mesmo pode ser tão difícil para algumas pessoas, mesmo sabendo que isso pode beneficiar a saúde mental.
A pesquisa, publicada no periódico Self and Identity, analisou as experiências reais de pessoas que se sentem presas à culpa e à vergonha após cometer um erro ou passar por uma situação difícil.
Para explorar as razões por trás dessa dificuldade, os pesquisadores ouviram e compararam histórias íntimas de 80 indivíduos que conseguiram perdoar a si mesmas em algum momento, com aqueles que sentiam que nunca conseguiriam.
O estudo descobriu que pessoas com maior dificuldade em se perdoar com frequência sentiam que o evento ainda estava fresco na memória, mesmo que tivesse acontecido anos atrás.
Essas pessoas reviviam o momento repetidamente, sentiam-se presas ao passado e lutavam contra emoções intensas, incluindo culpa, arrependimento e vergonha.
A autora principal do estudo, a professora de psicologia Lydia Woodyatt, afirma que as descobertas mostram que o autoperdão é muito mais complexo do que simplesmente "deixar passar".
“Autoperdão não se trata apenas de seguir em frente ou esquecer o que aconteceu”, afirma.
Segundo a pesquisa, pessoas que conseguiram se perdoar ainda pensavam no evento de vez em quando e, às vezes, ainda sentiam vergonha ou culpa, especialmente se estivessem em uma situação que as lembrasse daquilo.
“A diferença era que as emoções eram muito menos intensas e frequentes, e o evento não controlava mais suas vidas.”
A análise também mostrou outras características comuns no grupo de pessoas que conseguiam perdoar a si mesmas:
- elas faziam um esforço consciente para se concentrar no futuro;
- buscavam aceitar suas limitações (especialmente de conhecimento, julgamento ou controle na época);
- e se esforçavam para se reconectar com seus valores para seguir adiante.
Em contraste, a pesquisa mostrou que pessoas que sentiam ter falhado com alguém que amavam — como um filho, parceiro ou amigo — ou que também haviam sido vítimas, muitas vezes achavam mais difícil seguir em frente.
De acordo com a professora, isso desafia a ideia de que o autoperdão é apenas para pessoas que claramente fizeram algo errado.
“Às vezes, a autocondenação, a culpa e a vergonha surgem quando nos fazem algo errado ou em situações em que sentimos um senso de responsabilidade elevado – mesmo que não haja como controlar o resultado”, diz ela.
“As emoções são uma pista do que o cérebro precisa resolver para superar a autocondenação. As emoções são a dor que indica o local da possível lesão, por assim dizer”, acrescenta.
No caso da vergonha, da culpa e da autocondenação, trata-se do nosso cérebro ajudando a lidar com a lesão moral – ou seja, ameaças centrais às nossas necessidades psicológicas, como senso de escolha, controle e autonomia.
Além disso, as reações têm a ver nossa necessidade de pertencimento e de viver de acordo com valores compartilhados.
O estudo também descobriu que o autoperdão não é uma decisão única, mas um processo que leva tempo, reflexão e, muitas vezes, apoio de outras pessoas.
A professora afirma que as descobertas são importantes para profissionais de saúde mental que trabalham com pessoas que lidam com culpa e vergonha.
Ajudar alguém a se perdoar, portanto, não é dizer para a pessoa: “Não se envergonhe disso, não é sua culpa”.
Trata-se de ajudar a pessoa a entender de onde vem essa vergonha ou culpa e trabalhar essas necessidades psicológicas subjacentes, passando da lesão para a reparação moral — reafirmando seu senso de autonomia e identidade moral dali em diante.
A criminologista e psicóloga Melissa de Vel-Palumbo, que também participou do estudo, afirma que o trabalho traz insights valiosos ao revelar como as pessoas processam a culpa e a responsabilidade — fatores-chave para a compreensão de comportamentos ofensivos e para a reabilitação.
"Nesta pesquisa, nos baseamos em histórias reais de pessoas que refletiram sobre experiências dolorosas, algumas que remontam a décadas", afirma.
"Isso nos deu uma perspectiva única sobre como as pessoas realmente convivem com a culpa, a vergonha e a autocondenação ao longo do tempo."