Redação Publicado em 09/05/2025, às 10h00
Crises de enxaqueca são incômodas e podem até ser incapacitantes. Mas entre perder um dia de trabalho ou de aula e tomar um analgésico de venda livre, é comum as pessoas recorrerem à segunda opção.
O problema é que as crises podem aparecer várias vezes na semana, levando à utilização excessiva desses medicamentos. A consequência disso, é importante saber, é que as crises passam ficar ainda mais frequentes.
É um quadro conhecido como cefaleia por uso excessivo de medicamentos, conforme explica o médico Tiago de Paula, neurologista membro da International Headache Society (IHS) e da Sociedade Brasileira de Cefaleia (SBC):
Esses medicamentos não tratam a doença de forma efetiva e, quanto mais remédios você toma, menos eles funcionam e mais dor você sente."
Médico da equipe que trata a influenciadora Virgínia Fonseca, que já falou nas redes sociais sobre seu tratamento contra a enxaqueca, ele cita um estudo recente publicado no Journal of Headache and Pain, que confirma a relação e ainda traz outro dado preocupante.
Segundo o estudo, o uso desses medicamentos não só piora as crises de dor como também pode prejudicar o funcionamento de áreas importantes do cérebro ligadas à memória, regulação emocional e processamento visual.
A pesquisa incluiu 63 participantes do sexo feminino divididas em três grupos: pacientes com enxaqueca crônica; pacientes com enxaqueca crônica associada a cefaleia por uso excessivo de medicamentos; além de um grupo de controle saudável.
As participantes responderam questionários sobre suas crises de enxaqueca e sobre a frequência do uso de analgésicos. Também realizaram exames de ressonância magnética para obtenção de imagens do cérebro, que foram comparadas para identificação de diferenças no volume de massa cinzenta, na integridade da massa branca e na atividade cerebral espontânea.
Os pesquisadores observaram que o uso excessivo de medicamentos analgésicos promoveu uma redução significativa no volume da massa cinzenta em duas regiões específicas do cérebro:
Os pesquisadores também identificaram uma diminuição da amplitude fracionada da flutuação de baixa frequência (fALFF) no putâmen (estrutura redonda localizada na base da parte frontal do cérebro) direito. O que isso significa?
“A fALFF é uma medida da atividade cerebral espontânea. Segundo os pesquisadores, a diminuição desses valores no putâmen direito, estrutura cerebral envolvida no controle motor e aprendizagem, está relacionada com uma maior frequência de uso de analgésicos”, pontua o neurologista.
De acordo com o médico, o estudo reforça os riscos do uso excessivo e indiscriminado dos medicamentos para crise, o que pode piorar o quadro de enxaqueca e até prejudicar a função cerebral.
Além disso, fornece evidências sobre os mecanismos envolvidos nesse tipo de cefaleia – o funcionamento do putâmen pode vir a ser usado como biomarcador, auxiliando o diagnóstico e tratamento do quadro.
O neurologista ainda ressalta que, além de piorarem as crises e prejudicarem a função cerebral a longo prazo, esses remédios também podem diminuir a eficácia dos tratamentos de primeira linha, como a toxina botulínica e os medicamentos monoclonais Anti-CGRP.
Ele explica que a toxina botulínica, quando aplicada em pontos nervosos específicos, reduz a sensibilidade do cérebro à dor, ajudando no controle da doença enxaqueca.
Já os medicamentos anti-CGRPs bloqueiam o efeito do peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP), que contribui para a inflamação e transmissão de dor e está presente em maiores níveis em pacientes com enxaqueca.
O médico ressalta que o tratamento da enxaqueca também deve incluir mudanças na alimentação e no estilo de vida, principalmente para manejo de cronificadores da condição e acompanhamento multiprofissional. “A avaliação médica individual é essencial.”