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Novo estudo mostra que o cérebro emite luz através do crânio

O cérebro emite mais luz fraca do que a maioria dos outros órgãos devido ao seu alto consumo de energia - iStock
O cérebro emite mais luz fraca do que a maioria dos outros órgãos devido ao seu alto consumo de energia - iStock

Redação Publicado em 30/07/2025, às 10h00

Um novo estudo publicado no site iScience fornece evidências de que o cérebro humano emite sinais de luz extremamente fracos que não apenas atravessam o crânio, mas também parecem mudar em resposta a estados mentais. Os pesquisadores descobriram que essas emissões de luz ultrafraca podiam ser registradas na escuridão total e pareciam mudar em resposta a tarefas simples como fechar os olhos ou ouvir sons. As descobertas sugerem que essa luz cerebral fraca pode transportar informações sobre a atividade cerebral — possivelmente abrindo caminho para uma nova maneira de estudar o cérebro (fotoencefalografia).

Todos os tecidos vivos liberam pequenas quantidades de luz durante o metabolismo normal, conhecidas como emissões de fótons ultrafracas. Isso acontece quando moléculas agitadas retornam a um estado de menor energia e emitem um fóton no processo. A luz é incrivelmente fraca — cerca de um milhão de vezes mais fraca do que a que conseguimos ver — e se situa na faixa do visível ao infravermelho próximo. Ao contrário da bioluminescência, que envolve reações químicas específicas como as usadas pelos vaga-lumes, as emissões de fótons ultrafracas ocorrem constantemente em todos os tecidos, sem enzimas ou compostos brilhantes especiais.

O cérebro emite mais dessa luz fraca do que a maioria dos outros órgãos devido ao seu alto consumo de energia e à densa concentração de moléculas fotoativas. Estas incluem compostos como flavinas, serotonina e proteínas que podem absorver e emitir luz. As taxas de emissão de fótons também parecem aumentar durante o estresse oxidativo e o envelhecimento, podendo refletir alterações na saúde ou na comunicação celular.

A equipe de pesquisa, liderada por Hayley Casey, Nirosha Murugan e colegas da Universidade de Algoma, Universidade Wilfrid Laurier (ambas no Canadá) e a Universidade Tufts (EUA), queria saber se essas emissões de luz fraca poderiam ser usadas para monitorar a atividade cerebral. Ao contrário de outros métodos de imagem que requerem estimulação — como campos magnéticos fortes ou luz infravermelha — a medição de EUPs (emissões de fótons ultrafracas) é totalmente passiva. Isso significa que não introduz nada de novo no cérebro.

Refletindo estados mentais

Os pesquisadores propuseram que as EUPs poderiam oferecer uma nova maneira de monitorar a função cerebral com segurança e sem interferência, semelhante à forma como o eletroencefalograma rastreia as ondas cerebrais elétricas sem aplicar energia. Eles também queriam testar se as EUPs refletiam estados mentais como descansar com os olhos fechados ou responder a sons, e se esses sinais correspondiam a mudanças conhecidas nos ritmos elétricos cerebrais.

Os pesquisadores recrutaram 20 participantes adultos saudáveis e mediram as EUPs e a atividade elétrica cerebral enquanto os participantes estavam sentados em um quarto escuro. A configuração incluiu tubos fotomultiplicadores posicionados próximos às regiões occipital e temporal da cabeça, onde o cérebro processa informações visuais e auditivas. Um terceiro sensor registrava a luz de fundo. Ao mesmo tempo, os participantes usavam um boné com sensores de eletroencefalografia para registrar os ritmos elétricos cerebrais.

Os participantes passaram por uma sessão de gravação de dez minutos que incluiu cinco condições. Primeiro, sentaram-se com os olhos abertos e, em seguida, com os olhos fechados. Em seguida, ouviram um estímulo auditivo simples e repetitivo, seguido por outro período de olhos fechados e, finalmente, outro período de olhos abertos. O objetivo era verificar se as UPEs cerebrais respondiam a manipulações conhecidas da atividade cerebral, particularmente à mudança nos ritmos alfa que ocorre quando as pessoas fecham os olhos.

As emissões de fótons foram registradas em intervalos curtos de tempo e analisadas quanto à variabilidade, conteúdo de frequência e estabilidade ao longo do tempo. A equipe comparou os resultados com sinais de fundo e examinou as correlações com ritmos cerebrais elétricos registrados simultaneamente.

Descobertas

Os pesquisadores descobriram que a luz emitida pelo cérebro podia ser distinguida da luz de fundo com base em sua variabilidade e complexidade. As emissões de fótons ultrafracas cerebrais apresentaram maior entropia e um sinal mais dinâmico do que as gravações de fundo. Essas emissões também apresentaram um perfil de frequência distinto abaixo de 1 Hz, o que significa que a luz flutuava em padrões rítmicos lentos aproximadamente uma vez a cada um a dez segundos. Essa assinatura não estava presente na luz de fundo e era especialmente pronunciada na região occipital - parte posterior da cabeça, onde se encontra o osso occipital e o lobo occipital do cérebro.

Os pesquisadores também observaram que as emissões de fótons ultrafracas cerebrais pareciam atingir um estado estável durante cada tarefa, principalmente ao final dos segmentos de gravação de dois minutos. Esses padrões estáveis mudaram quando os participantes alternaram entre as condições de olhos abertos e fechados, sugerindo que as emissões refletem mudanças no estado interno do cérebro. No entanto, a direção da mudança não foi consistente entre todos os participantes, possivelmente refletindo diferenças individuais ou a complexidade dos processos metabólicos subjacentes.

Quando os pesquisadores compararam as UPEs aos ritmos elétricos cerebrais, encontraram correlações modestas. Por exemplo, os ritmos alfa — frequentemente associados à vigília relaxada e aumentados durante estados de olhos fechados — correlacionaram-se com as emissões de fótons da região occipital, mas apenas quando os olhos dos participantes estavam fechados. Eles também encontraram algumas associações entre a variabilidade das emissões de fótons ultrafracas e os ritmos do lobo temporal durante a estimulação auditiva. Ainda assim, as relações não foram fortes e muitas correlações esperadas não surgiram, destacando a necessidade de mais pesquisas.

Limitações do estudo

Embora os resultados sejam promissores, os autores alertam que este foi um estudo preliminar com diversas limitações. O tamanho da amostra foi pequeno e o equipamento de gravação cobriu apenas algumas áreas da cabeça. Os sensores também detectaram uma ampla gama de comprimentos de onda, o que pode ter obscurecido padrões de luz mais específicos. Filtros ou detectores mais precisos poderiam ajudar a revelar assinaturas específicas de comprimentos de onda relacionadas a diferentes funções cerebrais.

Os pesquisadores também sugerem que a expansão do conjunto de sensores poderia melhorar a resolução espacial e ajudar a identificar as origens das emissões de fótons ultrafracas no cérebro. Como essas emissões estão ligadas à atividade metabólica, elas podem vir de uma variedade de tipos de células, incluindo neurônios e células gliais, e de diferentes profundidades no cérebro. Desenvolver métodos para localizar esses sinais será um próximo passo importante.

O estudo não incluiu medições de outras partes do corpo, o que poderia ajudar a esclarecer se emissões de luz semelhantes ocorrem em tecidos não cerebrais e como elas diferem. Incluir mais participantes e explorar variações com base em idade, sexo ou estado de saúde também pode revelar padrões significativos. No futuro, o machine learning (aprendizado de máquina) e técnicas avançadas de imagem podem permitir que os pesquisadores decodifiquem padrões de EUPs e os utilizem para detectar distúrbios cerebrais ou monitorar a saúde cerebral.

“Vemos os resultados atuais como uma demonstração de prova de conceito de que padrões de sinais de EUPs derivados do cérebro humano podem ser discriminados de sinais de luz de fundo em ambientes escuros, apesar da intensidade relativa do sinal muito baixa”, escreveram os pesquisadores. A fotoencefalografia seria maximamente não invasiva (ou seja, registro passivo) com alta resolução temporal, como o eletroencefalograma ou a magnetoencefalografia; no entanto, a medição de EUPs estaria ligada ao metabolismo oxidativo, com diversas aplicações clínicas descritas em outros lugares. Estudos futuros podem ter sucesso no uso de filtros e amplificadores selecionados para filtrar e aprimorar as características do sinal de emissões de fótons ultrafracas de cérebros saudáveis e doentes.

Fonte: PsyPost