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Vai viajar? Confira dicas para não correr o risco de ter trombose

Em viagens longas de avião, há uma conjuntura de fatores que vão potencializar o risco de trombose - iStock
Em viagens longas de avião, há uma conjuntura de fatores que vão potencializar o risco de trombose - iStock

Estamos às vésperas das férias de meio de ano. E depois de muitos meses de pandemia, e com a vida tentando voltar ao normal, muitas pessoas estão mais que ansiosas para viajar de novo. Porém, é preciso cuidado, especialmente se a distância for longa. Isso porque viajar de avião, por exemplo, aumenta o risco de trombose, termo que se refere à condição na qual há o desenvolvimento de um “trombo”, um coágulo sanguíneo, nas veias das pernas e coxas (que entope a passagem do sangue).

Entrevistamos a cirurgiã vascular e angiologista Aline Lamaita, médica membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular, que explica tanto os problemas que podem surgir, quanto as medidas que podemos tomar para evitá-los. Confira:

Por favor, explique por que as pernas e pés incham quando ficamos muito tempo sentados?
O sistema venoso é programado para trazer o fluxo de sangue de volta para a circulação, de baixo para cima, contra a gravidade. O grande protagonista desse sistema é a panturrilha, a batata da perna, que é conhecida como o "coração das pernas". Ela funciona como uma grande bomba, ejetando o sangue em direção ao pulmão, para ser reoxigenado e redistribuído pelo coração. Sempre que temos uma situação em que a panturrilha não trabalha direito, o sangue se acumula nas pernas, não tendo um retorno adequado, o que vai levar à retenção de líquido, inchaço, sensação de pernas pesadas e cansadas, que são sinais de que a circulação não está adequada. Como o pé é o mais distal (a parte mais afastada do tronco), é o primeiro a sentir o reflexo da retenção de líquidos, devendo ser ele nosso sinal maior de alerta para que algo não vai bem.

Inchaço pode provocar problemas sérios de saúde?
A longo prazo, a retenção pode piorar as varizes, causar alterações de coloração da pele, e dermatites (inflamação da pele), mas, a curto prazo, podemos aumentar a chance de complicações como erisipelas (processo infeccioso da pele) e o problema mais temido, que é a trombose venosa profunda.

Como podemos evitar que isso aconteça quando estamos em uma viagem de avião?
Em viagens longas de avião, temos uma conjuntura de fatores que vão potencializar nosso risco. O primeiro se refere à posição restrita das cadeiras (não é à toa que essa complicação ganhou o nome de "síndrome da classe econômica"), pois permanecemos muitas horas na mesma posição, sem movimentação adequada das pernas, e com elas dobradas, isso somado à dificuldade para se levantar e tentar andar pelo corredor. Hoje, já existem trabalhos evidenciando um risco maior para os passageiros que se sentam na janela e não nos corredores, que acabam se movimentando menos ainda. Se já não fossem suficientes esses riscos, temos que adicionar a desidratação, que é provocada pela diminuição de ingestão líquida para evitar ir ao banheiro do avião, somada à causada pelo ar condicionado e pela pressurização da cabine. A desidratação pode “engrossar” o sangue, isso somado à diminuição de velocidade, conferida pela restrição de posição, pode ser um prato cheio para desenvolver uma trombose.

E quando estamos em uma viagem de ônibus?
As viagens de ônibus frequentemente têm paradas obrigatórias que permitem que os passageiros realmente se movimentem de uma forma maior, já que não estariam restritas ao corredor do meio de transporte. Neste caso, o risco é menor, mas deve ser realizada com cautela de qualquer forma.

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Viajar de carro tem a vantagem de que as paradas para andar e "esticar as pernas" podem ser mais frequentes  - iStock

Viajando de carro, podemos nos prevenir mais que dos outros modos, já que podemos fazer mais paradas?
As viagens de carro se tornam ideais porque as paradas podem ser feitas de forma sistemática para que se ande um pouco a cada duas horas, reduzindo o risco de complicações, assim como as de ônibus, mas medidas ativas podem ser feitas para reduzir o inchaço.

O que vestimos também influencia nesses problemas de inchaço?
É importante, em qualquer viagem, usar roupas confortáveis, evitar calças que comprimam o abdômen, uso de cintas, ou qualquer vestuário que aumente a pressão intra-abdominal, que dificulta terrivelmente a circulação das pernas. Cuidado com meias ou calças que possam fazer dobras e incomodar em pontos específicos, causando um garrote, e especial cuidado para sapatos e sandálias que ficam amarradas nas pernas, e possam causar um garrote no caso de um inchaço. O uso de meias elástica de compressão é extremamente benéfico, já que evita a retenção de líquido das pernas, estimula a circulação, aumenta a velocidade do fluxo sanguíneo nas pernas e evita a trombose.

Devemos nos alimentar de outra forma antes de uma viagem?
Antes de uma viagem, devemos ter uma refeição mais leve, com alimentos de fácil digestão e pobres em sódio, para não estimular a retenção. Evitar alimentos muito processados, industrializados, salgadinhos e refrigerantes, pois são muito ricos em sódio. Lembrar de que o consumo de álcool, mesmo com moderação, causa muita retenção de líquido, além de diminuir nossa mobilidade durante a viagem, o que nunca será benéfico para a circulação.

E a época do ano que optamos por viajar, faz diferença?
Um dos fatores que mais favorecem a retenção de líquidos é o calor, por isso, no final de ano, a maioria das pessoas pode sentir as pernas mais pesadas e cansadas. O calor tem o poder de dilatar as veias, diminuindo a velocidade do fluxo de sangue e causando retenção. O inverno sempre será a época de predileção para quem sofre muito de retenção durante as viagens, além de diminuir a retenção de líquido, favorece muito o uso das meias elásticas de compressão. Apesar de as meias hoje terem opções tecnológicas, com efeito climático, podendo ser usadas até durante o esporte, existe uma crendice popular de que elas esquentam, o que dificulta seu uso no verão.

Quais dicas, além das citadas, podemos seguir para evitar os inchaços?
O inchaço pode acontecer com qualquer um, e está relacionado a vários fatores, principalmente em situações em que se permaneça muito tempo parado, alimentação inadequada, calor, e até mesmo durante o uso de algumas medicações. No caso das mulheres, ainda há o período menstrual. Mas devemos lembrar que algumas pessoas com condições como pressão alta, hipotireoidismo, insuficiência cardíaca ou presença de varizes podem ver esse problema exacerbado. Sendo assim, é essencial uma consulta médica. Medidas gerais, como manter uma movimentação mais ativa, andar a cada duas horas, movimentar as pernas a cada 15 minutos, usar meias de compressão, beber muita água e evitar álcool são benéficas para todos. Mas pacientes com condições especiais podem se beneficiar de tratamentos mais específicos, medicamentosos e, às vezes, até cirúrgicos, para melhorar a retenção e inchaço.

Se o inchaço ocorrer apenas em uma perna, ou for algo frequente, é sinal de algo mais grave?
Sempre que o inchaço ocorrer em apenas uma perna, um sinal de alerta deve ser acionado. Edemas que ficam unilaterais podem ser decorrentes de alterações ortopédicas localizadas, mas a principal preocupação nesse momento é descartar a possibilidade de uma trombose venosa profunda. Sendo assim, inchaço em apenas uma das pernas, e repentino, deve ser levado a sério e a ajuda médica deve ser providenciada de imediato, principalmente se estiver associado à queixa dolorosa.

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Dra. Aline Lamaita

Dra. Aline Lamaita

Cirurgiã vascular, membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV), da Sociedade Brasileira de Laser em Medicina e Cirurgia, do American College of Phlebology, e do American College of Lifestyle Medicine. Formada pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, hoje dedica a maior parte do seu tempo à flebologia (estudo das veias). Possui título de especialista em Cirurgia Vascular pela Associação Médica Brasileira / Conselho Federal de Medicina. RQE 26557. Instagram: @alinelamaita.vascular

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Site Doutor Jairo