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Pílula do dia seguinte: tire todas as suas dúvidas sobre o método

A pílula do dia seguinte é um método de emergência para evitar uma gravidez indesejada - iStock
A pílula do dia seguinte é um método de emergência para evitar uma gravidez indesejada - iStock

Milena Alvarez e Jairo Bouer Publicado em 07/02/2021, às 07h00

A pílula do dia seguinte é um método de emergência para evitar uma gravidez indesejada em casos de esquecimento ou falha do método contraceptivo convencional. É um recurso importante para situações em que a camisinha estourou, a mulher esqueceu de tomar o anticoncepcional, fez sexo desprotegido ou mesmo em casos de violência sexual.  

Entretanto, seu uso deve ser exceção e nunca a regra. A pílula do dia seguinte tem de seis a 20 vezes a dose hormonal de uma pílula comum. Sendo assim, utilizá-la com frequência pode acarretar maiores problemas, como irregularidade menstrual. A seguir, explicamos melhor como esse método funciona e esclarecemos dúvidas comuns sobre o assunto.

Um pouco de história

A década de 1960 foi marcada por uma revolução sexual que teve como protagonista o surgimento da pílula anticoncepcional. Nessa realidade, o sexo deixou de ser tratado apenas como forma de reprodução e proporcionou aos casais manter relações sexuais por prazer. 

A pílula do dia seguinte foi formulada por um médico canadense chamado Albert Yuzpe, responsável por descobrir que o uso de altas doses dos hormônios presentes nas pílulas convencionais poderiam prevenir uma gravidez mesmo após a relação sexual.

Apesar de já na década de 1970 existir a prescrição do medicamento nos consultórios brasileiros, foi só em 1994 que ocorreu a primeira a primeira experiência pública com a pílula do dia seguinte no Brasil.

Em 1996, com o intuito de ampliar o Programa de Atendimento à Saúde da Mulher (PAISM), o Ministério da Saúde começou a orientar o uso do método. Atualmente, as pílulas são produzidas em larga escala pela indústria farmacêutica, sendo que há produtos de marca e genéricos. 

Enorme avanço para a mulher

O acesso à pílula do dia seguinte representa um enorme avanço para as mulheres no país e no mundo. Em primeiro lugar, porque todos os métodos anticonceptivos têm algum risco de falha.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, mesmo que todas as mulheres sexualmente ativas utilizassem métodos anticonceptivos de forma correta e regular, ainda ocorreriam cerca de seis milhões de gestações indesejadas por causa dessas falhas.

Em segundo lugar, nem sempre as relações sexuais são voluntárias ou desejadas. A violência ou coerção sexual pode ocorrer mesmo numa relação conjugal, o que impede a livre decisão das mulheres. Só nos EUA, estima-se que ocorram 32 mil gestações por ano decorrentes da violência sexual.

Mecanismo de ação

A pílula do dia seguinte tem como base o hormônio levonorgestrel, um tipo de progesterona sintética que, em doses altas, inibe ou adia a ovulação.

Vale acrescentar que também existe o “método Yuzpe” de contracepção de emergência, que previa o uso combinado do etinilestradiol e levonorgestrel (presente em muitas pílulas anticoncepcionais). Esse método pode causar mais efeitos colaterais e tem um índice de falha um pouco maior, por isso o Ministério da Saúde preconiza o uso isolado do levonorgestrel, e reserva o outro apenas para situações excepcionais, como em áreas remotas onde é mais fácil adaptar o uso da pílula combinada por escassez de recursos.

Outra razão que fez a pasta abandonar o método Yuzpe foi o fato de que o etnilestradiol pode interagir com alguns medicamentos antiretrovirais – em casos de estupro, a mulher é aconselhada a também fazer uso da profilaxia do HIV. Com o levonorgestrel isolado, é possível evitar a gravidez e o vírus da Aids ao mesmo tempo.

A pílula do dia seguinte pode atuar de duas formas, dependendo da fase do ciclo menstrual em que a mulher se encontra ao utilizá-lo:

  • Se a ovulação não ocorreu ainda, o hormônio impede a liberação do óvulo. Ou seja, se está perto do período fértil, a pílula retarda a ovulação 
  • Caso a ovulação já tenha acontecido, o hormônio torna o muco do colo do útero mais espesso e dificultam o encontro do espermatozoide com o óvulo  

Causa aborto?

É importante ressaltar que a pílula do dia seguinte não causa aborto. O efeito no organismo da mulher acontece antes mesmo da ocorrência da gravidez. Dessa forma, o medicamento age dificultando o encontro do espermatozoide com o óvulo (a fecundação).

Se tomado após o óvulo fecundado ter se implantado no útero, a pílula de emergência não impedirá a evolução da gravidez. Vale acrescentar que a progesterona é, inclusive, um hormônio essencial para a gravidez.

Quando e como tomar? 

Para evitar uma possível gravidez, a pílula do dia seguinte deve ser tomada o mais rápido possível (apesar do nome, não é preciso esperar o dia seguinte). É que sua eficácia diminui de maneira progressiva com o passar do tempo. 

Assim, o ideal é que a pílula do dia seguinte seja tomada nas primeiras 12 ou 24 horas após a relação sexual – período que garante maior eficácia, na ordem de 95%. Mas também é possível utilizá-la em até 72 horas (ou 3 dias) após a relação suspeita. Se tomada depois desse prazo, no quarto ou no quinto dia após a relação, a eficácia diminui bastante, e a mulher deve ficar atenta para o risco de gravidez.

Alguns estudos indicam que as taxas de eficácia das pílulas do dia seguinte podem ser um pouco mais baixas para mulheres com sobrepeso ou obesidade.

Conclusão? Mesmo quando tomada de forma correta, a pílula do dia seguinte apresenta uma margem de falha e não garante 100% de proteção. Portanto, é aquela velha história: melhor prevenir do que remediar.

De acordo com o Ministério da Saúde, as principais indicações para o uso da pílula do dia seguinte são:

  • deslocamento do diafragma;
  • rompimento do preservativo;
  • esquecimento prolongado do anticonceptivo oral ou atraso do injetável; 
  • coito interrompido em que ocorre derrame do sêmen na vagina;
  • cálculo incorreto do período fértil, erro no período de abstinência ou interpretação equivocada da temperatura basal;
  • casos de violência sexual, quando a mulher ou adolescente são privadas de escolha e submetidas à gravidez indesejada;
  • relação sexual desprotegida sem uso de nenhum método contraceptivo e preservativos (masculino ou feminino).

Apresentações

A pílula do dia seguinte pode ser consumida em qualquer dia do ciclo menstrual e cada caixa contém apenas um comprimido (de 1,5 mg de levonorgestrel) ou dois comprimidos (com 0,75 mg cada).

Na apresentação com duas doses, a mulher deve tomar a primeira assim que possível, e a segunda deve ser tomada 12 horas após a primeira dose (o que pode totalizar quatro ou cinco dias de uso).

Porém, a dose única tem sido recomendada quase sempre, já que evita o risco de esquecimento, e, segundo a OMS, é tão segura e eficaz quanto as duas doses.

Fale com seu médico

Vale lembrar que é sempre aconselhável entrar em contato com um ginecologista para explicar a situação e receber orientações corretas. Como já foi dito anteriormente, o uso contínuo da pílula do dia seguinte não é recomendado como método contraceptivo de rotina.

Outro motivo pelo qual é importante falar com um médico antes é para saber se existe alguma contraindicação para o uso. Em geral, o método exige precauções quando a mulher tem doença hepática, entre outras condições. Também deve-se evitar a pílula do dia seguinte em caso confirmado ou suspeita de gravidez.

Tem efeitos colaterais? 

Pela alta dose de hormônio, pode haver alguns efeitos colaterais, como dores de cabeça, náuseas, vômitos, desconforto no estômago, tonturas e alterações no ciclo menstrual. A depender da fase do ciclo em que a mulher tomou a pílula do dia seguinte, é possível que haja sangramento alguns dias depois do uso.

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O preservativo é o método contraceptivo de primeira escolha, já que protege contra gravidez e infecções sexualmente transmissíveis. Mas a pílula do dia seguinte é um recurso importante quando há acidentes com a camisinha (iStock)

Quando o método é utilizado com frequência, há risco de irregularidade menstrual, ou seja, o ciclo da mulher fica totalmente bagunçado. Nesses casos, os hormônios ficam tão desregulados que já não é possível saber precisamente quando ela está no período fértil ou ovulando, o que pode até resultar num risco mais alto de uma gravidez indesejada. 

A recomendação, quando a mulher começa a repetir o uso da pílula do dia seguinte, é procurar um ginecologista que ofereça opções de métodos contraceptivos que deem maior segurança à paciente. As pílulas anticoncepcionais convencionais, por exemplo, contém menores dosagens de hormônios, causam menos efeitos colaterais e são mais eficazes. Também há outras formas de administração, como adesivos, injeções ou implantes, para quem costuma esquecer de tomar a pílula. 

Avisos importantes

Se a mulher apresentar vômitos nas duas primeiras horas após a administração da pílula do dia seguinte, é preciso tomá-la de novo. 

Também é importante destacar queo método não protege a usuária do HIV ou de outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), como sífilis, hepatite B, HPV, gonorreia. Para isso, é fundamental usar a camisinha!

O preservativo (masculino ou feminino) continua sendo o método contraceptivo de primeira escolha, especialmente para adolescentes, por causa dessa dupla proteção. Como já foi dito, a pílula do dia seguinte é um recurso importante quando há acidentes com a camisinha, e nessas situações a profilaxia do HIV e de outras ISTs também pode ser considerada.

Preciso de receita?

Na prática, é possível comprar a pílula do dia seguinte sem receita nas farmácias brasileiras. No entanto, de acordo com o ginecologista Eliano Pellini, chefe do setor de saúde e medicina sexual da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC), é comum haver confusão com o nome ou a forma de uso. Por isso, ele recomenda que meninas e mulheres já saiam da consulta de rotina com o ginecologista, ou mesmo com outro médico, com uma receita assinada e sem data, com todas as instruções de uso.

Vale ressaltar que as brasileiras também têm direito de receber a pílula do dia seguinte de graça no SUS (Sistema Único de Saúde). Em tese é possível obtê-la nas unidade básica de saúde (UBS), sem que haja necessidade de passar por uma consulta médica.

Existem diversas ofertas de marcas no mercado; entre as opções de marcas estão Hora H, Postinor Uno, Neodia, Dopo e Diad. Também é possível adquirir o medicamento genérico Levonorgestrel 1,5 mg.

Perguntas frequentes sobre o tema

Ainda que o método seja conhecido por grande parte das mulheres, esse é um assunto que ainda gera muitas dúvidas. Por isso, decidimos reunir as perguntas que chegam com maior frequência no site e nas redes sociais:

Posso engravidar mesmo com a pílula do dia seguinte?

O risco de engravidar ao se tomar corretamente a pílula do dia seguinte é muito pequeno. Mas o método não apresenta 100% de eficácia, e quanto mais a mulher demorar para tomar o medicamento, menos eficaz ele será. O ideal, como já foi dito, é tomar nas primeiras 12 horas após a relação sexual desprotegida. 

A bebida alcoólica corta o efeito da pílula?

Não. O problema está em vomitar após ingerir uma grande quantidade de álcool, o que impede a absorção completa do hormônio. Portanto, para não comprometer a eficácia do medicamento, a recomendação é espaçar a ingestão da pílula com o consumo de bebida alcoólica, evitando beber em excesso para não correr o risco de vomitar. 

O que eu faço se vomitar depois de tomar a pílula do dia seguinte?

Se o vômito ocorrer até duas após a tomada, deve-se tomar uma nova dose. Se o vômito ocorrer depois de duas horas, não é preciso tomar de novo. Como algumas mulheres podem sentir enjoo com a dose única de levonorgestrel, Pellini diz que é comum já sugerir que a paciente consuma junto um antiemético (remédio contra enjoo). Se mesmo assim ocorrerem vômitos, ou se isso se repetir após a mulher ter tomado a pílula do dia seguinte de novo, a administração vaginal pode ser considerada.

Costumo emendar uma cartela de anticoncepcional na outra, mas esqueci de tomar um dia; devo tomar a pílula do dia seguinte?

O ginecologista explica que se a mulher usa a pílula anticoncepcional continuamente, mas esquece de tomar um ou dois dias seguidos, não há necessidade de recorrer à pílula do dia seguinte porque, em tese, sua ovulação já estaria inibida. Nesse caso, é só tomar as duas pílulas anticoncepcionais juntas, como se recomenda em caso de esquecimento. Na dúvida, pergunte ao médico.

Devo usar a pílula do dia seguinte antes de uma relação sexual desprotegida?

Não. Trata-se de um método de emergência, não de contracepção. Se você quer evitar a gravidez, converse com o ginecologista para saber qual o método contraceptivo mais adequado para você. Enquanto isso não acontece, use a camisinha, que ainda tem a vantagem de proteger contra as ISTs (infecções sexualmente transmissíveis).

A pílula do dia seguinte perde o efeito se eu usar várias vezes?

O uso repetitivo ou frequente da pílula do dia seguinte compromete sua eficácia ao longo do tempo. Mas isso acontece porque há um acúmulo das sucessivas taxas de falha em cada exposição. Não há evidências de que a pessoa desenvolva uma “tolerância” ao hormônio.

Tomei a pílula do dia seguinte e a menstruação está atrasada; o que eu faço?

O método pode, de fato, causar atraso menstrual, dependendo da fase do ciclo em que a mulher tomou a pílula do dia seguinte. Segundo o ginecologista, a orientação é esperar até sete ou oito dias de atraso para fazer o teste de gravidez ou falar com o médico. Ou seja: se a menstruação era esperada para o dia 10, e ainda não veio no dia 17 ou 18, só então a mulher deve pensar em fazer o teste.

Fontes: Dr. Jairo Bouer; Dr. Eliano Pellini,chefe do setor de saúde e medicina sexual da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC),Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia); Ministério da Saúde; Organização Mundial da Saúde (OMS); Proteste

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