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Maternidade: 12 pontos para levar em conta na hora de escolher

Uma maternidade deve ser escolhida baseada em qualidade e segurança como sendo seus pilares principais - iStock
Uma maternidade deve ser escolhida baseada em qualidade e segurança como sendo seus pilares principais - iStock

Cármen Guaresemin Publicado em 22/07/2022, às 10h00

A hora do parto é um dos momentos mais mágicos da vida de uma mulher. Algumas preferem que seja algo que pertença apenas a ela e ao(a) acompanhante. Outras não se importam que várias pessoas possam assistir à chegada do bebê em uma sala ao lado. Atualmente, há maternidades que oferecem essa opção e outros serviços bem diferenciados. Mas se levarmos em conta os números de violência obstétrica: cerca de 45% na rede pública brasileira e 30% na rede particular, segundo estudo da Fiocruz de 2021, o que é realmente importante nesta hora?

Para ajudar as grávidas que estão em dúvida, conversamos com dois médicos, Linus Fascina, Gerente Médico do Departamento de Maternidade e Pediatria do Einstein, e Denise Gomes, ginecologista e obstetra pela PUC-Campinas e criadora do canal Mamãe Plena no Youtube.

1-Quais características de uma maternidade devem ser levadas em conta durante a escolha?

Para Fascina, uma maternidade deve ser escolhida baseada em qualidade e segurança como sendo seus pilares principais. Ela deve proporcionar uma experiência para a gestante que possa ser referida por confiabilidade, transparência e respeito aos direitos de escolha das vias de parto, alinhada aos desejos de seu companheiro ou companheira e equipe médico-assistencial, e ao que há de melhor na prática médica. Portanto, também alinhada com uma política clara centrada na mulher e seu bebê, para que seu corpo clínico respeite os preceitos éticos e, fundamentalmente, os direitos da gestante.

Ele frisa um dos principais pontos - a preocupação com a taxa de cesáreas realizadas na instituição: “Já que enfrentamos uma epidemia de cesáreas desnecessárias. Em 2016, o Brasil teve a maior taxa de partos cesáreos do mundo, sendo de 30% a 40% no setor público e de 80% a 90% dos partos na saúde suplementar por cesariana, isso embora um estudo de 2014 tenha identificado que entre 70% e 80% das mulheres brasileiras que dão à luz pelos serviços oferecidos pela saúde suplementar preferiam um parto vaginal”.

O médico lembra que, de acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde), taxas de cesarianas maiores que 10%, em nível populacional não estão associadas com redução de mortalidade materna e neonatal, e, idealmente, uma cesárea deveria ser realizada apenas quando necessária, do ponto de vista clínico.

“É fundamental que a maternidade publique ou deixe acessível em seus canais de comunicação com o público os resultados de seus indicadores de qualidade e segurança, bem como de produção, por exemplo, mostrando suas taxas de partos por via vaginal e as de cesáreas. Assim como indicadores que demonstrem sua assistência ao recém-nascido, como números de bebês encaminhados à UTI neonatal por idade gestacional, além de seguimento em sua sobrevivência aos cuidados intensivos diante do risco inerente da prematuridade e doenças desta faixa neonatal”, acrescenta.

Na opinião de Denise, diversas características têm que ser levadas em consideração, como a localização: “Uma mulher estando em trabalho de parto ou em alguma urgência precisa ter fácil acesso à maternidade. A disponibilidade de vagas, se faz parte da sua referência do SUS ou se tem cobertura pelo plano de saúde. Gestantes de alto risco precisam estar inseridas em serviço de maior capacidade de atendimento, com a disponibilidade de UTI adulta e neonatal, por exemplo”.

2-É importante realizar visitas aos espaços? E o que questionar sobre ofertas?
Denise acha essencial: “Recomendo muito que o casal visite a maternidade previamente, conheça e se familiarize com a sua estrutura, tire suas dúvidas quanto à assistência, apresente seu plano de parto para ver se está de acordo com a política do serviço que, em sua maioria hoje em dia, oferece visitas programadas para as usuárias nesse sentido. Também vale para sentir a acolhida dos profissionais. Tudo isso facilita muito o momento da internação trazendo conforto e segurança às pacientes”.

Fascina conta que a jornada da gestante pode se iniciar muito antes da gestação. Isso porque a maternidade pode oferecer assistência e ambientes seguros para garantir serviços que acolham a mulher desde o seu desejo de engravidar até o ciclo gestacional, com um pré-natal tranquilo. “Essa assistência anterior à gestação pode se dar, por exemplo, com serviços médicos laboratoriais de diagnósticos diferenciados, como análises genéticas aprofundadas, até detalhes ultrassonográficos pormenorizados em departamentos chamados de Medicina Fetal ou Medicina de Precisão”.

3-Se o hospital tiver outras especialidades, é importante que a maternidade seja em uma área separada?
Para o médico, sim, a maternidade deve ocupar uma área separada. Para tanto, é importante uma área dedicada, com equipe habilitada com profissionais de diferentes formações complementares, como médicos obstetras, enfermeiras obstetras, obstetrizes, fisioterapeutas e outros, e que esteja atenta aos detalhes, para garantir a segurança e qualidade e uma ótima experiência do paciente. Denise acha que isso não é necessário. “Os serviços têm que estar dentro de todas as normas de segurança e qualidade, mas podem compartilhar alguns espaços físicos”.

4-É importante que haja salas adequadas para parto normal e cesárea?
Denise afirma que sim, a sala de cesárea se assemelha mais a uma de cirurgia convencional, equipada para realizar procedimentos anestésicos e cirúrgicos complexos e emergenciais. A sala de parto normal deve oferecer maiores recursos para a autonomia da paciente e permanência mais prolongada. “Durante o trabalho de parto, a parturiente deve se locomover, tentar diferentes posições, preferencialmente usar banheiro com privacidade. Recomendamos que esteja disponível o banho terapêutico. A maca deve ser maior, mais confortável e permitir diversas posições da paciente. E essas salas também devem ser preparadas para realizar procedimentos como analgesia de parto”.

Fascina comenta que as áreas para partos normais permitem uma maior flexibilidade para a presença de mais membros da família, que, neste período da pandemia de Covid-19, foram restritos por medidas de segurança e redução de contaminação. “Para os partos normais, é importante ter espaços que permitem uma escolha, inclusive, da melhor postura livre para ter o recém-nascido: cócoras, em pé ou deitada (a paciente escolhe qual a melhor posição para ela). Estas salas também precisam ser equipadas para atender qualquer tipo de emergência com a mãe ou o bebê. Quando em parto normal, é importante lembrar que neste ambiente exclusivo a gestante deve continuar se alimentando e ingerindo líquidos normalmente, já que o parto vaginal não exige jejum, diferente do que acontece no parto cesariano, que configura como ato cirúrgico e requer um período de jejum”.

Ele fala, por fim, que em casos de cesáreas eletivas autorizadas acima de 39 semanas ou as de emergência, por se tratar de um procedimento cirúrgico, é necessário que as salas obstétricas sigam toda a complexidade e regras de um ambiente cirúrgico, inclusive com espaços de recuperação anestésica, o que dificulta, muitas vezes, a permanência dos recém-nascidos com suas mães.

5-Se a gestação não é de risco, a paciente precisa se preocupar com suportes de terapia intensiva ou estrutura para alta complexidade?
Mesmo em uma gestação não considerada de risco, o médico recomenda que a gestante deve se preocupar em ir para uma maternidade com suporte para alta complexidade, pois o parto, ainda que seja algo natural, pode ter intercorrências. Na maioria das vezes, não é notado nenhum indício de risco durante o trabalho de parto, no entanto, há cerca de 6% a 8% de alguma possibilidade de haver intercorrências que demandam o auxílio de profissionais de enfermagem e médicos altamente habilitados.

“Se alguma acontecer, é necessário dispor de uma unidade de terapia intensiva neonatal e suporte para a mãe também. É bom lembrar que, de acordo com a OMS, apenas 15% dos partos totais deveriam caminhar para uma cesárea, quer seja por motivos obstétricos, quer seja por sofrimento do feto”, afirma.

Denise argumenta que nas gestações de baixo risco, bem acompanhadas no pré-natal, do começo ao fim, com vitalidade materna e fetais preservadas, a preocupação com alta complexidade é menor, pois o risco de complicações diminui bastante. No entanto, é fundamental uma estrutura de retaguarda ou de transporte adequados das pacientes se necessário. E todo o processo de internação tem que ser acompanhado por profissionais qualificados.

6-Se a gravidez for de alto risco, é relevante saber se o local tem UTI adulto e neonatal?

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Em casos de gravidez de alto risco é fundamental que a mãe tenha à sua disposição uma UTI voltada para o atendimento - iStock

Para Fascina, em caso de gestação de alto risco, a maternidade precisa ter serviços considerados de um hospital terciário, capacitado a atender toda gama de urgências do binômio mãe/recém-nascido. Na prática assistencial é fundamental que a mãe tenha à sua disposição uma UTI voltada para seu atendimento, seja no pré-natal ou pré-parto, momentos nos quais pode apresentar crises de hipertensão arterial, diabetes gestacional descompensada, insuficiência de órgãos (se quadros agravados); ou ainda após o parto, se apresentar estas mesmas complicações ou outras resultantes do parto, como atonia uterina e hemorragias graves. Em todas essas circunstâncias, é necessário que a maternidade esteja habilitada a dar suporte avançado de vida a esta gestante.

Denise acrescenta: “Cada risco tem que ser cuidadosamente avaliado e a gestante deve ser encaminhada para centro especializado de acordo com sua demanda, a fim de reduzirmos morbimortalidade materna e fetal. Em situações de emergências obstétricas, o tempo é o principal fator para determinar um desfecho favorável ou desfavorável”.

Quanto ao recém-nascido, o médico frisa que o grande diferencial é o atendimento pediátrico ou neonatal que deve se dar já na sala de parto, com exame físico completo do bebê e avaliação constante de seus sinais de vitalidade. Quer seja por prematuridade, intercorrências como anoxia inesperada (ausência ou diminuição da oxigenação no cérebro do bebê) ou doenças congênitas, estes recém-nascidos poderão necessitar de suporte avançado de vida em uma UTI neonatal. “Estas unidades, no mesmo modelo de transparência que a maternidade, devem publicar seus indicadores de qualidade e segurança, como suas taxas de controle de infecção hospitalar, de sobrevivência de acordo com o baixo peso dos recém-nascidos e prematuridade, de preferência comparando-os em plataformas com dados de instituições renomadas. Onde atuo, comparamos nossos dados com o Vermont Oxford Network (VON, rede internacional de hospitais, que inclui alguns hospitais brasileiros). Esta troca de comparação serve como estímulo para mostrar a constante busca por excelência”.

7-É indicado levar uma equipe própria ou tudo bem contar com os médicos do próprio hospital/maternidade?
Para a médica, ambas as opções são válidas. “Em alguns serviços não existe a possibilidade de levar equipe externa, e o acompanhamento será exclusivamente feito pela equipe de plantão. Em outros, essencialmente privados, a gestante pode escolher e contratar equipe privada, ou pode optar pela assistência com a equipe do plantão”.

Já Fascina acredita que o melhor modelo de maternidade, hoje, é aquele que garante uma equipe completa de médicos e enfermeiras obstetras de plantão 24 horas em todos os dias da semana, para que atendam a paciente desde a entrada no hospital até a hora do parto e acompanhamento do puerpério, se assim for preciso. Isso porque a gestante em trabalho de parto demanda, muitas vezes, decisões rápidas para o melhor desfecho. Isto não impede que as gestantes tenham seus próprios médicos e equipes. Porém, pela qualidade e segurança do binômio, a maternidade deve ter uma equipe completa de plantão.

8-Em tempos de pandemia, vale perguntar quais procedimentos o local toma em relação a isso?
“Sim, é preciso conhecer quais as medidas de isolamento e outras iniciativas de segurança adotadas pela maternidade, tanto em casos nos quais a mãe testou negativo para a Covid-19, quanto nos casos em que testou positivo no momento do parto”, argumenta Fascina. Denise lembra que cada serviço adequou medidas às suas necessidades, dependendo do risco maior ou menor de transmissão intra-hospitalar do vírus: “Foi uma situação de calamidade que requereu medidas emergenciais. Mas acredito que na atual situação da pandemia, a grande maioria dos serviços já tenha retomado a normalidade da assistência”.

9-Além dos profissionais, existe algum tipo de tecnologia que pode oferecer mais segurança neste momento?
Fascina cita as cardiotocografias, por exemplo, além de aparelhos de ultrassonografia e sonares para monitorar principalmente a vitalidade do feto: “São tecnologias conhecidas e obrigatórias. Além dessas, hoje já existem protocolos de triagem de risco, do binômio mãe/recém-nascido, que podem ser aplicados de forma digital, criando aplicativos que soltam sinais de alerta em caso de intercorrências ou aplicados manualmente, como o Meows (Modified Early Obstetric Warning Score ou Pontuação de Aviso de Obstetrícia Precoce)”.

10-A escolha da maternidade também pode mudar a vivência pós-parto?
Para Fascina, se dentro da estrutura houver um ambiente para as consultas pediátricas, a escolha poderá impactar positivamente. Ele conta que hoje se sabe que pelo menos uma consulta mais precoce entre o terceiro e quinto dia após a alta da mãe e do bebê, mesmo que por telemedicina, pode apoiar na segurança e na saúde de ambos. “Onde atuo, por exemplo, oferecemos aconselhamento para a amamentação desde o nascimento e mantemos este acompanhamento durante os primeiros sete dias após a alta. Também conseguimos avaliar se há persistência de hemorragia / sangramento pós-alta. Inclusive, desenvolvemos um protocolo nesse sentido que passou a ser usado pela Organização Panamericana de Saúde”.

11-A paciente pode decidir pelo parto humanizado, com direito a doula e parceiro(a)?
“Humanizados precisam ser todos os partos, pois mesmo nas cesáreas, quer por urgência ou eletivas por desejo, esta situação precisa sempre ser clara, transparente e acolhedora, mesmo em momentos difíceis”, diz Fascina. “Na verdade, todo parto tem que ser humanizado, independente da via, dos riscos, do serviço”, concorda Denise.

Quanto à presença de um companheiro ou companheira, isso é garantido por lei e é fundamental para uma boa assistência e suporte à gestante. “As doulas também são muito bem-vindas, pois são profissionais que ajudam a equipe médica a criar vínculos rápidos de confiança com a gestante”, elogia o médico.

12-Se a gestante quiser, pode ficar com o bebê o tempo todo no quarto depois de parir? Ou ele tem que ficar obrigatoriamente no berçário?
Querer ficar com o bebê desde a hora de ouro, que é a primeira logo após o nascimento, em que se coloca o bebê no peito da mãe já para iniciar o contato pele a pele, estimula a produção de leite, afeto e carinho entre eles, esclarece o médico. “Manter o recém-nascido dentro do quarto, criando o que se chama de ‘rooming in’ ou alojamento conjunto, é a melhor solução para gerarmos fortes vínculos entre ele e a mãe. Para que isso aconteça, a maternidade tem que ter um grupo de profissionais dedicados a gerenciar um hospital (maternidade) amigo da criança ou com cuidados centrados na família”, acrescenta.

“Hoje em dia acredito que todas as maternidades adotam o sistema de alojamento conjunto, quando o binômio mãe-bebê fica junto 24 horas por dia desde o nascimento até a alta, salvo situações de risco para um ou ambos, como, por exemplo, bebês prematuros que precisem de assistência em UTI neonatal”, finaliza Denise.

Fontes:
Denise Gomes é formada em medicina com residência em Ginecologia e Obstetrícia pela PUC-Campinas, especialista em Genitoscopia e Histeroscopia, Coordenadora de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Municipal do Campo Limpo (SP), mantém um canal no Youtube chamado Mamãe Plena.
Linus Fascina é Mestre em Medicina pela Escola Paulista de Medicina da Unifesp, Especialista em Melhoria pelo Institute for Healthcare Improvement. Gerente Médico do Departamento de Maternidade e Pediatria do Einstein.

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